Reminiscência - Corações Indômitos - Ch. 06 | Resiliência
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Emalgum lugar do espaço
Dois meses depois
Na mesa de controle, dois jogos de baralho estavam espalhados. Uma mulher e um homem estavam em silêncio. A mulher pegou uma carta do maço com os dentes cerrados com expectativa. Faltava somente uma carta para formar as três trincas necessárias para ganhar o jogo. Infelizmente, fazia quatro rodadas que estava ansiosa por isso.
Ela estalou a língua e jogou fora a carta que havia pegado. Um quatro de ouro. O homem do outro lado, riu e olhou rapidamente para a mulher.
— Bati. — Lentamente, colocou as cartas na mesa, mostrando todo seu jogo.
Uma trinca de dez, uma sequência de três cartas de copas e outra sequência de ouro: quatro, cinco e seis.
A mulher o olhou horrorizada e jogou as cartas para cima.
— Por-que-eu-nunca-ganho? — Falou pausadamente. — Benjamin, você não está roubando, certo?
— É apenas sorte, Major. — Ele sorriu brilhantemente.
Essas duas pessoas jogando pife, eram Benjamin e a Major Jessy Hilsman. Dentro desses dois meses, haviam jogado mais de dez tipos diferentes de jogos de cartas e a Major só conseguiu vencer duas entre dez vezes.
Havia apenas duas opções: ou ela era péssima ou sua sorte era ridiculamente baixa.
— Vou tomar um banho e descansar um pouco. — Benjamin falou enquanto juntava as cartas para guardar. — Major deveria ir também.
Viagens espaciais eram extremamente cansativas.
— Há alguns sedativos no refrigerador, caso precisar. — A Major comentou casualmente. Talvez ela precisasse mais deles do que Benjamin.
Estar no espaço, era como se perder na escuridão. Sem um rumo, era fácil se perder tanto no tempo quanto, direções.
Por todos os lados que se olhava era um vazio incomensurável, pronto para te engolir e muito solitário. Vez ou outra, era possível ver estrelas, nebulosas e planetas. Não era incomum passar por planetas artificiais ou naves que se tornaram uma grande comunidade. Não havia dia ou noite, apenas escuridão.
Não era tão glorioso quanto os antigos pensavam. Sem uma rotina rígida, de descanso e alimentação, a morte era como uma sombra em seu encalço.
O horário universal permaneceu contabilizando as vinte e quatro horas diárias e não havia dia ou noite. A divisão era o tempo de descanso e o tempo comercial.
[Entrada do espaço da Galáxia de Andrômeda em dois dias. Identificação necessária]
— Elza, burle o sistema e trace uma rota de fuga para a base da Águia Branca.
[Insira a senha de comando. Reconhecimento de DNA obrigatório]
Jessy digitou a senha no painel digital e em seguida, uma luz escaneou todo seu corpo.
[Verificando autoridade]
[DNA reconhecido]
[Seja bem vinda, usuária nº 958]
[Traçando rota de fuga para à Base 456342, território da Águia Branca]
— Ative o modo de camuflagem e o piloto automático.
Jessy relaxou na cadeira. Fazia setenta e duas horas que estava de plantão. Durante esse tempo, ela não conseguiu contatar ninguém de sua unidade.
A Major se levantou e se direcionou para a cápsula médica. Ela abriu o terminal em seu pulso e se conectou ao sistema médico da máquina e baixou as informações.
A expressão em seu rosto retorceu de desgosto e ela respirou fundo, exausta. Os sinais vitais de Lucas estavam ficando mais fracos a cada minuto que se passava e ela, mais ansiosa.
Tudo estava repleto de escuridão.
— Aah! — Ela chutou a cadeira que estava sentada há pouco.
O objeto foi arrancado do chão da nave com brutalidade e se chocou contra a parede.
— Tudo está dando errado! Porra! — Socou a mesa de controle, por sorte, essa mesa era capaz de aguentar até mesmo uma explosão nuclear.
Jessy estava sentindo-se frustrada por ser incapaz de qualquer coisa. Seus olhos, cheios de lágrimas transbordaram. Nesse ponto, já estava cansada demais de aguentar e desabou no chão, chorando até desmaiar de cansaço.
Benjamin, no quarto, deitou-se após se limpar.
Se havia algo parcialmente nojento sobre viagens espaciais era que uma pessoa poderia passar meses sem um banho.
Ainda que existissem naves capazes de armazenar água por longos períodos, eram restritas a uso militar e eram naves de grande porte. Naves de fuga como a do Marechal, não tinham essa capacidade.
O que restava era apenas se limpar ou simplesmente adiar o banho.
— Akasha.
— Akasha se apresenta ao mestre.
O pequeno robô doméstico, havia se transformado num orbe azul flutuante, agora, com sua própria inteligência artificial independente.
— Mestre têm baixos níveis de humor, gostaria que eu procurasse alguns programas de entretenimento? Há alguns programas em ascensão de acordo com os gostos do mestre…
— Coloque uma música apenas.
Ele estava sonolento, ainda muito perdido por tudo que havia acontecido.
— Akasha, conseguiu encontrar o Jones?
— Não há sinais do Dr. Jones, tentarei novamente quando chegarmos no espaço de Andrômeda. A Starnet está instável.
— Tudo bem.
Benjamin puxou o cobertor para cima dele e encarou o vazio além da janela circular.
“Não há lugar para voltar… é igual antes…”
A melodia adentrou seus ouvidos como um sedativo. Aos poucos, sua mente esvaziou assim como seu coração e finalmente, ele caiu no sono.
Não muito depois, privado de seu sono, Benjamin acordou assustado.
Toda a nave deu uma sacudida repentina e ruídos nada amigáveis. Ela estava tremendo violentamente, parecendo ser um chacoalhada por uma criança. Ben sentiu seu coração bater tão rápido, parecendo sincronizar com a nave. Ele se agarrou à beira da cama, implorando para que aquilo acabasse logo, porque seu estômago estava revirando de uma maneira ruim.
No meio da bagunça, a voz de Jessy nos autos falantes da nave surgiu tentando acalmá-lo. Era somente uma turbulência espacial comum quando estavam entrando numa galáxia. Mas, Benjamin, não mais acostumado a essas viagens não poderia se acalmar. Sua mente e coração não estavam tão conectados quanto pensava.
A turbulência durou o que pareceu uma eternidade, mas, eventualmente, começou a diminuir. O navio se estabilizou e puderam entrar no espaço de Andrômeda.
Nos dias que se seguiram, Benjamin não conseguiu se livrar da sensação de enjoo assentado em seu estômago. A turbulência poderia ter acabado, mas a sombra psicológica permaneceu. Fazia quanto tempo que não sentia isso? Uma década, duas décadas?
Ele se lembra que cada vez que atingia esse período difícil, seu batimento cardíaco sempre se elevava ao máximo e as mãos começavam a suar, levando também sua ansiedade em altos níveis. Talvez porque isso o lembrava a morte de seus pais, ou quando seu irmão mais velho desapareceu, mas ele não conseguiu se acalmar por dias seguidos.
Benjamin, no entanto, tinha uma certeza sobre algo: era medo o que circulava em suas veias. Medo de estar sozinho novamente. Foi por isso que se estabeleceu em um planeta tão populoso. Talvez fosse possível que a solidão fosse curada estando próximo de muitas pessoas.
Embora ele tivesse nascido no espaço, ele não era alguém que queria estar vagando. Assim como uma árvore, ele queria raízes. Infelizmente, isso parecia cada vez mais longínquo: tudo ao seu redor ruía toda vez que começava a se equilibrar.
— Aah! — Ele gritou ao dar um soco poderoso no colchão que dormia.
Devido a terceira lei de Newton, a força aplicada foi devolvida a ele e Benjamin se desequilibrou, caindo de costas no chão.
“Eu só não causo um desastre a mim, porque preciso encontrar esse maldito filho da puta.”
A porta do seu quarto foi aberta. Jessy manteve uma expressão preocupada.
— Ben!? O que houve?
Jessy olhou Benjamin no chão, encharcado de suor e tremendo.
— Apenas treinando… apenas treinando… — Ele disse fechando os olhos.
— Se quiser mentir, faça isso direito. — A Major se aproximou de Benjamin, ajudando-o a levantar.
Jessy compreendia que alguns assuntos deveriam ser ignorados ou esperar que a outra parte fale por si mesmo. Se estava mentindo ou não, a mulher não se importava, então não perguntou mais.
— Consegui contato com o Estrela Negra, — Benjamin a olhou com expectativa — a nave do Vice Comandante está em órbita, mas não consegui manter o sinal, provavelmente alguma peça quebrada no dispositivo da starnet.
— Isso é bom. — Ele suspirou.
“Era por isso que não conseguia entrar em contato com Clive…’
Benjamin franziu a testa.
“Por que Akasha não conseguiu identificar o problema?”
— Posso ter acesso ao controle principal da nave? — Perguntou, com um tom de cuidado. — Talvez eu possa consertar.
Ainda que suas condições estivessem péssimas. Era melhor concentrar em algo útil.
— Claro… se prometer que não vai me aprisionar. — Ele completou com um sorriso sem graça.
— Vai tentar algo ilegal?
— Talvez. — Ele tossiu. — Como está o Marechal? — Desconversou.
— Os sinais vitais são estáveis, mas para ter certeza… Apenas um especialista.
Benjamin fechou os punhos.
“Ele morreria assim, silenciosamente?”
E as lágrimas se formaram.
— Talvez haja algum jeito… — A voz de Benjamin era fraca.
— Lucas só está vivo porque é muito poderoso. Se não fosse por seu poder mutante, ele… — Jessy já estava começando a aceitar toda a situação. — O núcleo está quebrado a ponto de que não há como recuperar.
“A situação é pior do que eu imaginei…”
— Talvez alguém possa ajudar, se ele tiver sobrevivido… — Ele baixou a voz a ponto de sussurrar. — Conheço alguém que pode fazer ao menos uma tentativa. Marechal é alguém importante na minha vida, Jessy… — Benjamin olhou para a mulher a sua frente. — Desde sempre, me inspirei nele para me tornar alguém no meu futuro… Não quero vê-lo morrer silenciosamente e tão cedo… ele… merece mais…
Jessy não sabia como responder. Ela ficou sem palavras por alguns instantes antes de abrir um sorriso.
— Garoto… — Ela riu alto. — Você é uma boa criança! — Bagunçou os cabelos de Benjamin.
Benjamin encarou-a com má vontade.
—Eu não sou criança, já tenho vinte e sete!
Jessy continuou a rir.
— E eu tenho oitenta e dois. — Ela suspirou profundamente. — Venha, vamos nos animar um pouco. Ficar depressivo não vai nos ajudar em nada.
Jessy se levantou e puxou Benjamin contra sua vontade até o painel de controle da nave.
O painel era diferente de qualquer outra tecnologia que Benjamin havia visto. Os controladores e acessos eram desconhecidos por ele. Era algum tipo de projeto secreto?
— Vou lhe dar acesso como administrador da nave.
「Sistema RTX-500 conectado – Codinome Elza」
「Tenha um bom dia, Major Hilsman. Repasse o comando para começarmos os procedimentos. Em dezessete horas será possível fazer um salto, gostaria de programar quanto saltos? 」
— Bom dia Elza. Programe apenas um salto e em seguida adicione um administrador temporário. — Ela clicou na tela holográfica. — Qual seu número de usuário?
— 345234921.
— Você é de Olho Negro[1]? — Perguntou enquanto digitava.
O número do usuário de um civil é dado da seguinte maneira: os dois primeiros números era a numeração da galáxia. Os quatro próximos números era o ano de nascimento. O sétimo número era a escala de poder caso o humano seja um desperto e os dois últimos é a idade que o usuário despertou. Caso ele não seja desperto, a numeração de usuário é apenas a numeração da galáxia e o ano de nascimento.
Um militar, ganharia o número de usuário de acordo com o grau de realizações feitas.
— Bem, eu nasci naquele espaço. — Ele olhou para a interface de Elza.
「Escaneando usuário n º 34523492, trabalhador Benjamin Connor」
Um pequeno orbe flutuante circulou em torno do seu corpo, captando cada aspecto do seu corpo.
「Identificando D.N.A…」
「Carregando dados de rede…」
— É um lugar perigoso. — Ela digitou e acionou mais alguns comandos no painel. — As informações, irão ser transferidas para o seu hipocampo. Aquele lugar era como uma favela desg…
— Não é possível para todos nascerem cercados de ouro. — Ele clicou no terminal em seu pulso, aceitando as informações. — Alguém precisa nascer da miséria e morrer por aqueles no topo da cadeia alimentar, não é mesmo? — Falou com um leve tom de ironia.
— Não é exatamente assim, Ben…
— É exatamente assim. Não se faça de boa senhorita. — Seu olhar era sério.
Benjamin apalpou o bolso e estalou a língua: “Que irritante! Sinto vontade de fumar…”
— Não fale de um local que você não conhece. A Galáxia do Olho Negro é mais do que uma beleza obscura e indigente.
A Galáxia de Olho Negro foi uma das poucas que restaram após a descoberta dos zergs. Ela se tornou um campo de batalha de humanos e zergs e também um refúgio para marginalizados e piratas.
「Usuário identificado」
「Alerta de Emergência Nível Vermelho — Usuário na lista de procurados intergalácticos」
Benjamin encarou o alerta que piscando em vermelho. No instante seguinte, uma arma estava apontada para sua cabeça.
Publicado por:
- yuweihua
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Às vezes, me perco em minha própria loucura e quando vejo estou escrevendo.
Espero que se divirtam lendo minhas histórias, assim como me divirto aos escrevê-las ^^
você vai me achar no link abaixo:
https://xiaoyuautora.carrd.co/
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