A Noite Em Questão - XV
ODON
Ainda podia sentir o seu cheiro, permeando a minha roupa, estava entre os meus braços e o meu peito, subia até o meu pescoço, acho que abri os olhos algumas vezes, me lembro da estrada, da escuridão, de ouvir uma respiração pesada, de me ver alto, trêmulo, quente e frio. Foi quando comecei a sentir o seu cheiro, seu nome ecoou na minha mente, forcei-me a olhar pela ultima vez, tudo que vi seu pescoço, parte de seus cabelos loiros, era ele, soube no momento em que ouvi a sua voz, dizia algo que eu não conseguia ouvir, depois eu simplesmente apaguei.
Quando eu o vi na sala entrei em choque, não pude reagir, então, tudo aquilo havia sido real, não apenas um sonho louco, ele me olhou, vi seus olhos brilhantes fixados sobre mim, eu olhei para Rostam, ele me encarou, se levantou e veio até mim, senti sua mão sobre a minha. “Volte a dormir.” Disse ele, logo me levou de volta ao quarto, eu não hesitei em virar as costas para o homem, mesmo que parte de mim quisesse ir até ele, eu não podia simplesmente me esquecer da presença de Agha, havia uma barreira invisível que separava-nos um do outro, me deitei sobre a cama, me senti envergonhado, deveria ao menos ter agradecido, pensei, logo me remexi diante do travesseiro, era estranho, eu me sentia bem demais, mal conseguia lembrar do que me havia acontecido. Eu estava na clareira, acho que vi alguém, algo. Eu caí, não caí? Já não posso me lembrar, mas sei que estava no chão, eu estava com medo de algo, algo grande e pálido de olhos da cor de… eu não faço ideia, depois veio o coração, batia forte, era como se fosse sair de dentro de mim e gritar, logo uma voz, passos, eu apago e algo, alguém, me tira do chão, Berliac, era ele.
Rostam saíra do quarto, logo eu fiquei sozinho novamente, olhando para o teto, pensando no alfa que estava na sala, será que eu devia ir até lá? Ou talvez não? Era grosseiro de minha parte, mas as dúvidas assolavam a minha cabeça, foi quando lembrei dos olhos amarelados e dos dentes brilhantes, quase gritei, meu coração palpitou, eu já havia visto aquele rosto antes, com constância, no restaurante, eu sabia o que ele era, um vampiro, e não foi preciso de muito para que lembrasse do seu nome. Dimitry Vernon.
Eu pensei em me levantar, porém, ouvi passos, chegando cada vez mais perto, voltei para a cama, fechei os olhos, me virando para a parede, a posta se abriu, eu apenas pude ver um sombra, depois uma forte rajada de vento arrebentou-se contra a janela fazendo o vidro tremer e as cortinas balançarem, comecei a sentir aquele cheiro, era ele, prendi a minha respiração, logo ouvi seus passos, o homem estava no quarto e foi se aproximando da cama aos poucos , chegou bem perto, foi quando pude ouvir a sua voz próxima a minha orelha. “Você está dormindo?” Questionou, eu abri os olhos, mesmo de costas, assim ele pôde me ver, se aprumou lentamente, logo me virei para ele. “Se sente melhor?” Sua voz era calma. “Sim senhor.” Respondi. A luz do corredor invade o quarto por um pequeno frecho da porta, ela bate em meu peito.
“O que ele fez com você?” Questionou, foi tão direto que eu fiquei sem voz. “Nada senhor.” Disse em resposta, aquilo não pareceu agrada-lo, mesmo assim tentou não insistir, respirou fundo, então juntei dentro de mim a coragem, ficou na ponta da minha língua. “Obrigado.” Disse, Berliac lançou um olhar sobre mim, e então se aproximou mais uma vez, tudo que fiz foi ficar parado vendo ele chegando cada vez mais perto. “Você tinha razão.” Eu falei. “Tem algo de errado com essa lugar.” Ele permanece me encarando. “Coisas ruins estão acontecendo.” O alfa suspira. “Você o conhecia?” Perguntou para mim de forma descontraída. “Só de rosto.” Respondi. “Ele é um…” Antes que pudesse terminar ele me corta. “Um vampiro.” Exclama. “Eu sei, vi os seus olhos.” Logo ele continua. “Odon quero que entenda que eu posso te proteger, apenas me diga quem ele é.” A sua voz é séria, firme, rígida, eu respiro fundo. “Aquele homem frequenta o restaurante, eu já o vi muitas vezes e já ouvi muito sobre ele.” Pareço chamar a sua atenção. “Os funcionários o chamam de Vernon, Dimitry Vernon.”
Uma tensão paira sobre nós, eu sabia pouco sobre aquele homem, ele sempre pedia o mesmo, carne, batatas, molho, especialmente de pimenta, ás vezes bebia vinho, outras vezes pedia água, independentemente, ele era um cliente frequente por isso era sempre tratado com preferência, mas eu não olhava para ele, temia olhar, pois já havia sido orientado pelos meus colegas de cozinha, betas, mais velhos do que eu, e eles diziam que os vampiros tinham um grande olfato, que aquele homem sabia de cada tempero que botavam em sua comida, sabia da validade de cada vinho e de cada legume, era um caçador nato, um caçador natural e era melhor eu não entrar no restaurante, pois se ele sentisse o meu cheiro poderia esquecer o seu prato de comida e pedir para o chefe me cozinhar, eu os ignorei, parte daquilo era dito apenas para me amedrontar, porém ficou na minha cabeça, dentre todos ali, apenas o chefe podia sentir o meu cheiro, meu chefe e aquele vampiro, guardei um pedacinho daquela história de pedir para o chefe me cozinhar para dar de refeição ao vampiro, toda vez que chegava ao restaurante e via aquele homem eu lembrava disso, por isso prendia meus feromônios, e passava pelos fundos, até comecei a evitar o meu superior, não queria que ele se zangasse comigo e tomasse a liberdade de me temperar e dar de comer ao homem que ao meu ver parecia já ter se tornado um de seus amigos.
O fato era que muitas vezes eles se reuniam na varanda, todos menos eu, eu os via rindo, conversando e longe, nunca me chamavam, e nunca demonstrei vontade de participar, mas dentro de mim havia certa revolta, ora, por que comigo? Por que todos ali implicavam justamente comigo? Logo eu que nunca havia feito nada a ninguém, jogavam os legumes sobre a bacia de água para que a água respingasse e me molhasse, mesmo assim eu não dizia nada, e o chefe fingia não ver, a única pessoa que eu conversava era Yosef, porém ele fazia parte do carregamento manual, então geralmente nós só nos encontrávamos quando chegavam os legumes e as verduras.
Me afastei destes pensamentos, olhei para Berliac, o homem agora parecia estranho, distante, algo em seu olhar me preocupava, olhou bem para mim, por um bom tempo em silêncio sem dizer uma palavra, às vezes ele fazia isso, era assustador, e mesmo assim lá eu permaneci, logo ele tornou a olhar para a porta. “Eu preciso ir.” Disse ele. “Minha carona logo vai chegar.” Falou.
“Você promete guardar um segredo?” Eu disse antes que ele saísse, o alfa dominante se virou para mim curiosamente, logo se aproximou. “Eu prometo.” Exclamou de modo simpático, eu respirei fundo, havia sido informado disto pelos ômegas do dormitório, talvez eu não devesse contar mas de alguma forma com tudo que estava acontecendo eu me senti na necessidade de contar para ele, imaginei que gostaria de saber, eu me aproximei de seu ouvido e sussurrei. “Algumas noites, no dormitório, nós ouvimos vozes, elas chamam os nossos nomes e pedem para que saiamos do quarto, às vezes são batidas na porta, outras vezes podemos ver algo se movimentando em meio a escuridão.” Ele me olha de modo peculiar, logo segura o meu braço.
“Conte mais.” Pede, e então eu continuo. “Todos nós temos medo de sair a noite, por que alguns acham que há algo de muito runs escondido na floresta, algo que atrai as pessoas para lá.” Olho ao redor para me certificar de que não há mais ninguém nos ouvindo. “Eu sinto medo, sei que não tenho o direito de acusar ninguém sem provas, mas neste lugar assustador a desconfiança é a única coisa que pode me manter vivo.” Cedric aperta o meu braço. “O que quer dizer com isso?” Sua voz e firme, há algo de errado com ele, algo que não entendo, me remexo para que solte o meu braço, o quê ele não faz, apenas permanece me encarando com um olhar vazio e rígido, como se estivesse prestes a me dar um tapa. “Senhor o meu braço…” Eu exclamo tentando me soltar.
“Diga.” Ele ordena, porém aos poucos vou sentindo a dormência se alastrando, tento me soltar, aos poucos vou ficando desesperado, o que esta acontecendo com ele?
“Ele sabia o meu nome!” Exclamo. O alfa me solta, antes que pudesse dizer alguma coisa ouço o som de uma buzina, o homem fica atento, logo ele se apruma, arruma a sua roupa, de repente parece muito apressado, permaneço em choque, é quando vejo algo, quando a luz bate em seu corpo, mesmo coberto, vejo algo entre as suas pernas, um volume, logo ele se vira e sai tão rápido que fico ali plantado sem reação, ele estava tendo uma ereção? Tão de repente? Até mesmo para um alfa dominante aquilo não parecia ser normal, era a primeira vez que eu via um pênis ereto, saí da cama, fui até a porta e avancei, talvez ele tivesse percebido que eu havia notado aquilo, deve ter ficado envergonhado e decidiu sair, diante do corredor sinto a trilha de feromônios que por ele foi deixada, parecia estar fora de controle, exibindo seus feromônios por ai, tendo uma ereção repentina, foi quando tudo começou a fazer sentido, aquilo não era uma simples tensão e sim um sinal, um sinal de quê o Rut dele estava próximo.
Enquanto caminhava ouvi diversas vozes, distintas, eu congelei no corredor, hesitei, depois continuei, lentamente, muito atento cheguei até a esquina da sala, as vozes estavam lá, respire fundo, apenas pude por a cabeça para fora, vi os três homens, Rostam, Berliac e outro, um homem loiro que tinha uma voz arrogantemente simpática.
Logo o homem se retirou, junto a ele Berliac, quando estavam quase saindo eu tomei coragem para me inclinar, eu vi o alfa se afastando cada vez mais, indo em direção ao carro, eu respirei, havia outro cheiro na sala, foi quando o outro alfa parou, ele então se virou em questão de segundos, ele me viu, neste momento eu dei um passo para trás, havia tomado um susto, eu vi um sorriso se formar no canto dos lábios do homem, ele me olhou dos pés a cabeça, depois se virou para alcançar Berliac, de alguma forma, algo dentro de mim me fez permanecer imóvel, um mal pressentimento.
Cedric Berliac, ele se virou para mim antes de entrar no carro, um luxuoso carro preto, brilhante, de marca alemã. Seu olhar era penetrante, intenso, veraz, quase bruto, como um tapa na cara, acima de tudo era assustador, seu olhar me perseguiu até que o carro se afastasse, foi quando eu tive a certeza, si de fato o seu Rut estava próximo e aquela mudança repentina de comportamento explicava isso. “Eles já foram embora.” Disse Rostam. “Pode sair daí.” Eu imediatamente saí de trás da porta, ele me olhou brevemente, veio até mim. “Você está se sentindo bem?” Eu gosto dele, gosto demais, é uma pessoa incrível. “Sim senhor.” Respondi, vejo seu olhar mudando aos poucos. “Aquele homem, ele deixou o cheiro dele por aqui não foi?” Questionou, eu assenti em concordância, ele parecia tenso. “Que nojeira.” Exclamou. “Vou ter que deixar essas janelas abertas.” Eu respirei fundo e o segui para lhe ajudar a abrir as janelas. “Vá descansar, teve um dia longo.” Disse ele, eu baixei a minha cabeça timidamente, me virei para voltar ao quarto, assim que a janela se abriu uma forte rajada de vento invadiu o cômodo, o vento passou, senti um arrepio nas pernas, foi quando eu olhei para baixo, finalmente me dei conta de que estava de cueca este tempo todo, desde que havia despertado, fui buscar minhas calças em baixo da zombalheira conduzida por Rostam, meu rosto ardia, isso explicava muita coisa.
Os ômegas oscilavam pela infância, que ainda os retinha, e o despertar do homem e da mulher. Por momentos corriam como crianças, passavam voando pelas cercas, ou perseguiam uns aos outros com insetos que encontravam na beira da floresta, era no fim do dia que as risadinhas ficavam cada vez mais altas. Outras vezes escondiam-se nos lugares mais secretos e densos do bosque, faziam camas de folhas e ficavam por lá, olhando para aquele belo céu, aqueles eram os poucos momentos de paz que eles tinham, eu gostava bastante da sensação, às vezes dava era vontade de ficar o dia inteiro naquela correria, dando tapas na bunda dos outros e correndo para não levar também.
Aos poucos vou conquistando o respeito dos mais velhos, era como se tivessem começado a reparar em mim, me chamavam para comer com eles, também me incluíam em suas palhaças na hora do banho, já me sentia parte do grupo, começaram a me chamar para fazer outras coisas, como por exemplo participar das rodas de conversas noturnas, sobre a luz de uma única vela, os ômegas, fossem homens ou mulheres conversavam todos juntos, falavam sobre tudo e eu prestava toda a atenção do mundo, noto que ganhei varias outras coisas com a chegada da maior idade, era como se de alguns dias para cá eu fosse uma outra pessoa, tinha seios, não tantos é claro, mais do que antes obviamente, o suficiente para ser notado e comentado por Garcia e Joaquim, diziam estes que eu ganhara curvas, parecia uma prostituta daqueles filmes antigos de cinema, sempre de branco, com rendas e babados, olhares cansados e distante, sedutores.
Eu achava graça, dizia que estavam brincando, mais aquilo ficava dentro de mim, depois eu me escondia e ia ao banheiro, ficava de frente para o espelho, olhava para o meu corpo completo, começava a sentir uma vontade louca de rir, finalmente eu não era mais uma espécie de adolescente deslocado, e sim um homem, um homem adulto, com curvas e seios, olho no espelho mais uma vez, é quando passo a mão em meu rosto, vejo minhas feições, meus traços, é verdade, eu cresci.
Eu sabia que esse tempo iria chegar, começo a sentir os primeiros traços, os calores repentinos, os pensamentos obscenos inesperados, essas coisas me assustam, não sei se estou preparado para esta nova vida, sinto medo, a todo segundo, eu respiro fundo, tento me concentrar, olho ao redor, me vejo entre os meus iguais, ômegas, assim como eu, diante do rio.
À beira do córrego, tirei a minha roupa, dobrei as peças e as acomodei em uma pilha. Meu corpo tremia, sentindo a água suave. Por um instante hesitei, uma parte de minha mente começara a despertar. Então pensei em tudo, no que mais aconteceria, pensou nas coisas que estavam acontecendo, fui remexendo a água e cambaleando mais para a frente, até o meio, onde era mais fundo. Quando a água chegou na altura das coxas, fui descendo, bem devagar, imergi o rosto inteiro e sorvi uma longa e profunda respiração.
Nós, eu e os outros rapazes, ficamos um bom tempo no rio, perto do anoitecer do hotel, quando todas as luzes se apagavam, fomos embora, nos escondemos na mata e depois corremos para dentro dos dormitórios, em meio a risadas abafadas e o cheiro leviano de feromônios. Pela manhã seguinte outro homem havia morrido, seu corpo, encontrado na colina que contornava o leste da área de golfe, o seu pescoço estava quebrado, aberto e estraçalhado, e os seus olhos… Seus olhos não estavam lá, haviam sumido, restando apenas dois buracos escurecidos e sangrentos, seu nome era Yoon Baram e ele era um Alfa Dominante.
Publicado por:
• Closer from close theme.
• The middle of the world from moonlight theme.
• Mindnight muse.
• Funeral Canticle from the tree of life theme.
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