Blood Camellia - 4
Churrascaria 853, Seoul, Coreia do Sul, 2020
A quietude do lado externo da churrascaria trazia uma estabilidade perfeita para sua mente, enquanto todo o barulho rondava sem pausas as mesas, ali o silêncio predominava, e ainda trazia consigo uma brisa levemente gelada vinda do norte e com um cheiro não comumente visto em cidade, árvores, mas ali era possível sentir. Aquele era o lugar idôneo para deixar suas ideias jorrarem em direção ao papel.
Pegou o sketchbook que nunca saia de seu lado, independente do lugar em que estivesse, sempre próximo a ele sendo seu parceiro mais fiel, afinal nunca se pode garantir que a criatividade não surja em momentos extremamente inusitados e naquelas folhas estavam guardadas suas maiores e mais geniais ideias, vindas todas de momentos em que vira algo belíssimo, como esse, ou de momentos em que desespero o rondava.
Sentado no chão próximo aos canteiros de flores a mente de Sunoo trabalhava sem descanso, o lápis não fazia a mais ínfima pausa correndo sobre o papel branco, sempre em um constante movimento ritmado, às vezes tinha vontade de ser um espectador apenas para poder observar o processo, mas talvez isso nunca superasse o sentimento de ser aquele que estava criando.
O desenho já começava a transformar-se de rabiscos sem sentido para o uma forma humana ideal, ainda que primordial e nua, mas logo depois a cobria com roupas, uma nova criação, uma nova obra de arte.
O corpo masculino coberto por um sobretudo de tecidos negros se transformava, alguns detalhes em renda surgiam nas mangas e gola, uma cintura marcada contemplava o traje, dignos da alta costura de desingners importantes, uma calça social cobrindo as pernas de forma tão delicada e única que pareciam parte do corpo do boneco, enquanto a camisa de botões de tons avermelhados feita com o mais puro cetim corria como água definindo os mínimos detalhes corporais, a gola aberta mostrava o final imaginado da tatuagem de Dowan, coberta com uma renda vermelha tranparente oriunda da camisa interna.
E foi naquele mesmo momento que a mente de Sunoo parou. A imagem que preenchia o papel que em algum momento fora branco, agora era quase uma réplica perfeita do homem tatuado, incluindo a tatuagem parcialmente vista, a cicatriz limpa em seu pescoço e um pequeno pedaço da cicatriz em sua mão, que imaginava com muita riqueza de detalhes se estendendo até um pouco acima, em direção ao antebraço chegando até as costas que deveriam ser muito musculosas tendo em vista seus ombros largos. Tão belo quanto o real.
Perdido em pensamentos com o homem e o desenho, sua atenção foi redirecionada para o som de uma porta se abrindo, sem notar o garoto, Dowan passou pela porta sendo seguido pelos gêmeos, o jovem Oh se encolheu sem saber como agir quanto à interrupção de seus devaneios mas, para sua sorte, sua presença estava escondida pelo belo canteiro de flores, então preferiu ficar encolhido e em silêncio. Sua visão estava parcialmente obstruída por algumas poucas folhas, porém era possível ver os irmãos se curvando em frente ao homem como cavaleiros perante ao seu rei. Uma presença tão imponente.
E então Sunoo foi capaz de imaginar uma cena onde o homem vestia uma releitura de um uniforme de gala militar em tons pretos coberto por uma capa vermelha carmesim e em seus cabelos escuros repousava uma coroa reluzente de ouro. O jovem não se importaria de abrir mão de sua liberdade constitucional por um monarca com essa aparência.
“Dê pé.” A ordem vinda da voz grave foi tão clara quanto um cristal e os dois se levantaram com respeito, e então Junho acendeu um cigarro para o homem.
“Hyung, aquela sênior te incomodou?” A voz de Inho soou baixa e magoada dentre o som da brisa que corria.
“Você sabe que esse tipo de pirralho me incomoda, porque eu tenho que fazer essa porra?” Dowan soou irritado com sua resposta e tragou o cigarro com força soltando a fumaça branca logo em seguida.
“Vamos tratar de negócios, talvez te acalme. Como foi a viagem para a China? O presidente Ikira não fez nenhum movimento, então provavelmente não sabe do desvio na rota.” Junho, sendo sempre o mais responsável dos irmãos, começou. O suspiro dado pelo homem foi audível, a menção desse tal ‘presidente Ikira’ pareceu irritá-lo e então Sunoo notou, o sobrenome do belo homem próximo a ele também era Ikira, provavelmente era seu pai.
“Eu consegui o que precisava com o novo líder do Clã Zhou, aquele tal Wei, e isso inclui alguns bons homens que não queriam se juntar ao novo regime ligado ao grupo Heilong, devem querer ser minimamente fiéis aos mandamentos deles, Jia ficou responsável pelas coisas lá. Infelizmente esse é um assunto que temos que discutir todos juntos, seja em chamada ou pessoalmente.” Mais um trago, a luz que emanava do cigarro brilhava nos olhos de Dowan os dando um brilho á ser admirado. “Quanto ao meu pai, ele sabe que eu mudei a rota, mas tudo que ele e os espiões dele viram é que eu estive na China por uma semana hospedado em um hotel com uma mulher, e sempre que eles me viam sair era com ela. Jia tem uma boa atuação quando quer, mas em algum tempo ele vai começar a desconfiar de algo. Como estão as coisas por aqui?”
“As coisas estão bem e estáveis, mas no mês passado quando fomos para uma vila próxima a Busan e eu notei alguns movimentos suspeitos entre os apoiadores do presidente por lá, principalmente o diretor Choi. Mas nós planejamos ir até lá no próximo mês ou talvez nesse.” Inho entregou ao homem um tablet, que somente agora Sunoo havia notado estar presente, mostrando alguns dados.
Antes a luminescência era amarelada por conta da luz do cigarro que brilhava, mas agora a luz branca que irradiava do tablet trazia um deleite especial sobre o homem. Nós míseros segundo onde fora capaz de observar a elegância descomunal que marcava aquele rosto, o jovem Oh teve vontade de memorizar ou fotografar aquela beleza, sua mente se iluminou, milhares de ideias rondando, agora em vez de um belo traje em preto de alta costura ou de um traje militar remodelado de um rei, o homem em seus sonhos trajava um tecido branco com alguns detalhes minimalistas em azul, um belo hanfu de estilo levemente modernista, os belos panos que cobriam seu corpo tremulavam com o vento e ele se deleitava vendo-o abanar-se com um leque branco com alguns detalhes em vermelho.
Estava tão focado que por um instante se esqueceu que não deveria estar ouvindo aquela conversa e acabou se movendo um pouco para, em uma tentativa falha, afastar os devaneios que o rondavam, no entanto, acabou se desequilibrando e apoiando-se em um pequeno galho nos arbustos próximos a ele, que se quebrou. Sunoo paralisou e fechou os olhos com força assustado, mas nada aconteceu, nem um passo em sua direção, nenhuma voz o chamando.
“Enfim, os detalhes vão ser tratados com o resto do pessoal quando nos reunirmos e discutido com cautela, nós não queremos começar uma guerra sem motivo, ainda mais com a quantia de aliados que temos no momento, nós conseguimos cortar alguma rotas de comércio, mas isso não vai ser o suficiente. Isso é apenas para ele saber que não tem o controle de tudo, os próximos movimentos têm de ser precisos.” De olhos fechados, Sunoo não notou o curto olhar dado em direção a ele e menos ainda o pequeno sorriso de canto que surgiu no lábio do homem por poucos segundos. “Como está meu irmão, Inho?”
“Achei que o hyung não se importava com a família.” A risada do gêmeo mais velho ecoou seguido de um tapa do irmão. “Disse que você tem o apoio dele, mas que não irá intervir em nada, a não ser que você precise levar alguns pontos. Nesse caso ele disse que vai ter o maior prazer em te costurar.”
“É óbvio, é a cara dele.” A leve risadinha fez o coração de Sunoo acelerar, não foi preciso ver o rosto de Dowan, somente o som de sua risada já era suficiente. “Vamos entrar, quero beber um pouco.”
Notando o movimento, o jovem se virou cobrindo o corpo com as mãos, numa tentativa infantil de cobrir a própria presença, e se escondeu até que enfim ouvisse a porta abrir e então fechar novamente. Quando o silêncio voltou a reinar no passifico jardim, finalmente teve a coragem de sair, mas no momento em que se levantou viu algo que paralisou seu corpo pela segunda vez no dia, Dowan estava escorado no batente da porta com um sorriso de canto nos lábios, não sabia se havia travado pelo susto ou por ter tal sorriso direcionado a si de forma tão direta, talvez tivessem sido as duas coisa.
“Nunca te disseram que é feio ouvir a conversa dos outros, gatinho.” O susto de perceber que aquilo era real e não parte de sua fertil imaginação de artista fez Sunoo recuar e derrubar o sketchbook que estava em sua mão. Uma risada sonoramente agradável soou enquanto o homem se aproximava do garoto e antes de chegar até o pequeno jovem paralizado, abaixou-se para pegar o caderno e devolver.
Ao lembrar o que estava desenhado na folha, o garoto corou fortemente, aquilo era interessante para Dowan e despertou sua curiosidade em ver o que estava no papel. “Belo desenho, eu usaria algo assim se você pedisse.”
“Desculpa, eu não… É que eu gostei da sua tatuagem… eu não devia….” O sketchbook foi devolvido para o jovem que levou-o ao rosto em uma tentativa falha de cobrir o vermelho predominante em sua pele. Dowan sorriu pela reação, tão fofo. Parecia realmente um gatinho se escondendo com as patinhas.
“Você é adorável…” O homem se aproximou ainda mais, os deixando com pouco mais de um palmo de distância, e com a aproximação vinha aquele cheiro, sem dúvidas um perfume importado, Dowan levou uma das mãos ao cabelo castanho claro de Sunoo retirando uma pétala de flor rosada que lá repousava, os olhos do garoto voaram até os de Dowan e de lá não conseguiram ser desviados, aqueles olhos azuis cativantes que pareciam o mais belo céu de verão, sem nenhuma nuvem turbulenta e então a cicatriz que atravessava um deles, uma linha como a presente em seu pescoço, limpa e reta.
Sabe aqueles momentos na vida que parecem ter sido tirados de filmes clichês de romance? Esse era um desses momentos. Enquanto a leve brisa soprava trazendo o leve odor das plantas e os olhares conectados pareciam atraídos como ímãs, o rosto de Dowan se aproximou levemente para soprar a pétala, antes de deixar a mão forte cair no pescoço do jovem com um carinho leve e delicado, tudo ao redor seu não parecia existir, sua atenção focada completamente no homem a sua frente, era como estar no meio do nada, em uma floresta deserta, os sons no interior da churrascaria não eram audíveis para eles.
A mão quente quente repousava em seu pescoço, tão quente quanto as brasas em meio às chamas, ao tocar a pele levemente gelada pelo tempo que o jovem passará ao lado externo do restaurante, havia lhe causado um choque térmico que fez sua pele se eriçar, não só a sua, como a do homem também. Aquilo era algo que nunca havia sentido ao ser tocado por outra pessoa, independente de quem fosse, sua pele nunca havia se arrepiado por um toque não sexual e seu mundo nunca havia congelado apenas por olhar dentro dos olhos de alguém.
Em seu primeiro namoro com um sênior que agora era um soldado, seu primeiro amor, quando se tocavam era bom, mas nunca tinha feito com que achasse que era a única pessoa no mundo como esse momento fazia, os olhares que tinham trocado não eram em nada parecidos com esse. Ou com seu atual namorado, que por mais que amasse, não lhe fazia sentir essas famigeradas borboletas em seu estômago causadas pela ansiedade de algo novo, uma sensação animadora e um pouco assustadora, que fazia com que quisesse abrir mão de tudo somente para sentir mais desse sentimento, ao em vez dessas sensações, nos últimos meses de relacionamento tudo o que havia sentido era receio em momentos de intimidade e que precisava de cautela quanto a cada coisa que falava e como agia.
Mas neste momento, era como se nada que ocorria no mundo tivesse alguma importância, como se todas as suas dores tivessem sido apagadas, como se tivesse encontrado a verdadeira segurança, como se nada pudesse estragar os segundos, talvez minutos, em que ficaram se encarando. No entanto, o mundo nunca colabora para novos romances surgindo e algo estragou, uma tosse fingida se sobressaiu em meio ao som do farfalhar das árvores que derrubava algumas folhas no pequeno jardim dos fundos.
Hyuk estava ali parado ao lado da porta os encarando, seus olhos brilhando no vermelho mais vivo, cobertos pelo ódio. Sunoo sabia o que o namorado estava vendo com aquela cena, traição, mesmo que isso não fosse o que estava acontecendo ali. Mas afinal, qualquer um vendo de fora poderia achar isso, os dois estavam próximos e se olhando com uma intensidade admiradora, a mão de Dowan em seu pescoço ainda mantia o carinho, e o garoto abraçado com o caderno e com o rosto corado como uma virgem sendo tocada pelo verdadeiro amor pela primeira vez em sua vida.
E ainda havia a reação suspeita que havia seguido o momento, o jovem Oh havia empurrado a mão do homem e se afastado assustado, como se tivesse cometido o maior dos crimes, enquanto o homem apenas encarou Hyuk com a cabeça levemente inclinada colocando a mão caída no bolso e dando um sorriso de canto, tão cínico, quase debochando do jovem irritado, mas seus olhos tinham um brilho assustador de raiva por algo ter os interrompido.
A veia na testa de Hyuk quase estourou ao notar isso, o ciúme corria em seu sangue e corroía sua mente, o transformando em um ser irracional. E em um impulso extremo voou em direção aos dois e agarrou a cintura do namorado pressionando com força, mostrando sua dominância, talvez uma marca roxa se formasse ali mais tarde.
“Boa noite, amor.” A voz cheia emanava a necessidade de demonstrar que aquele era o ‘seu homem‘, como se fosse um animal lutando por uma presa.
Os olhos dos homens pareciam travar uma guerra eterna no momento em que se cruzaram, enquanto os olhos castanhos do jovem Ong brilhavam cheios de violência, os azuis brilhavam com uma pitada de deboche e agora, quase imperceptível, estava aquela luz assustadora. Este que ao ser capturado pelos olhos castanhos os fizeram explodir, talvez uma veia se rompesse em seus olhos pelo quão alta sua pressão parecia estar, e o jovem avançou transbordando na ira mais pura e animalesca.
Sunoo não sabia o que fazer diante da ação do namorado, nunca havia presenciado uma briga violenta e muito menos o namorado perdendo o controle nesse nível, tudo o que conseguiu fazer em meio ao estado de torpor causado pelo pânico foi agarrar aquele braço que avançava com os punhos fechados em direção ao maxilar do homem de regata branca, que não parecia se importar em apanhar, mas talvez estivesse com vontade de revidar. Ele havia conseguido impedir o pequeno massacre que tentava surgir, suas duas mãos fechadas em torno do pulso de Hyuk tremiam e estavam geladas pelo medo.
Aquela situação não poderia ser mais desesperadora e tudo piorou quando o namorado olhou para ele, o olhar transbordando de raiva e ódio agora estava direcionado apenas a ele e isso poderia significar apenas uma coisa, depois eles teriam uma conversa em casa que culminaria em uma briga e séria de todas as maneira, muito provavelmente, a pior que teriam. Mas ao olhar para Dowan, ao olhar em seus olhos azuis, sentiu algo próximo de segurança, a forma com que o homem desviou o olhar focado em Hyuk e o olhou como se quisesse tirá-lo dali lhe trouxe um pouco de confiança para tomar suas próprias iniciativas, aquilo não poderia ser duradouro, aquele sentimento não era certo, não nesse momento quando seu namorado estava fervendo em ódio, não agora e nem em momento nenhum.
“V-vamos, hyung…” Os olhos do garoto estavam cheios de lágrimas que imploravam para escorrer e sua voz emitia som choroso e implorativo que fez o coração de Dowan clamar pela dor, ainda mais quando o casal saiu porta a fora.
[…]
A cama king size rangeu com o forte impacto do corpo em sua borda, o frágil corpo de Sunoo que fora jogado com tamanho força que emitia uma queimação dilaceradora para todos os pontos de impacto, suas costelas que haviam acertado a quina pareciam estar quebradas pela dor que sentia, seu pulso já apresentava uma grande marca vermelha da palma de uma mão, já que havia sido arrastado à força para dentro do grande apartamento, e uma cachoeira de lágrimas escorria de seus olhos junto a pequenos soluços fugiam por entre seus lábios, agora tão brancos de medo quanto seu próprio rosto. O caminho até ali havia sido um silêncio mortal, cortado apenas por um choro silencioso e alguns suspiros irritados vindos de Hyuk.
O patriarca da família, Ong Il-Sung, e sua esposa, Ong Bora, não estavam presentes em casa por conta de uma viagem ao exterior, isso significava que não importava a que nível a briga chegasse, ninguém iria intervir, nem naquela noite e menos ainda no fim de semana que viria. O quarto espaçoso era familiar ao extremo, cada canto era conhecido, já haviam passado muitas noites ali na presença um do outro, algumas tão boas que cada vez que lembrava tinha vontade de sorrir, essas sendo cada vez mais raras, e outras tão terríveis como está viria a ser. As mãos do namorado voaram em direção a sua blusa de botões em tons claros com tamanha violência que a rasgou transformando em trapos, talvez querendo conferir se sua mordida ainda estava lá marcada em bordô, talvez querendo conferir se havia alguma outra marca que não lhe pertencesse presente.
“Que porra foi aquela?!” O grito ensurdecedor soou cortando o choro do pequeno namorado e o calando. Hyuk se ajoelhou entre suas pernas deixando o namorado ainda mais assustado com o que poderia vir a acontecer.
“N-não… Não é i-isso que você e-está p-pensando…” A voz de Sunoo tremia e era impossível impedir os gaguejos de saírem.
As mãos de Ong correram pelos fios macios do namorado como um carinho repleto de amor antes de dar um puxão violento, o forçando a olhar para seu rosto, fazendo com que um gemido de dor escapasse. “Você me pertence, é MEU, entendeu?” Soltou o cabelo do jovem e então um tapa estalou na bochecha manchada de lágrimas a tornando vermelha, do pior jeito seu rosto havia adquirido um pouco de cor. “Se deixar algum filha da puta de tocar, eu te mato.” As mãos correram em direção ao pescoço fino, aos poucos apertando, aquilo nunca tinha acontecido, era a primeira vez que era machucado daquela forma.
“Desculpa hyung… P-por favor… eu não… vou te trair.” Em meio a tentativas falhas de respirar, a voz que implorava por clemência saia entrecortada, naquele momento, pela primeira vez em meio a todas as brigas violentas, ele sentiu medo da morte, pela primeira vez ele quis se rebelar e fugir para longe, parar de abaixar a cabeça e obedecer. Quando sua consciência estava começando a se esvair, ele foi finalmente solto e possesso de raiva Hyuk agarrou seu braço e o arrastou para o banheiro, o jogando dentro do box de vidro.
O impacto de sua cabeça na parede de mármore fez toda a visão ficar em branco, talvez estivesse sangrando pois era possível sentir algo como um líquido escorrendo por seu couro cabeludo, e a água fria que fora ligada acima dele caia em seu corpo o fazendo tremer, um corpo sensível como o do pequeno garoto já não suportava tamanha dor.
“Vai tomar a porra de um banho, eu consigo sentir de longe o fedor do cigarro daquele desgraçado.” A porta bateu com força e nesse momento Sunoo chorou despejando todas as dores nas lágrimas que eram cobertas pelas gotas de água, tão frias quanto uma chuva em meio ao inverno.
Tudo o que passava em sua mente era um grito de socorro, uma voz implorando em seu subconsciente para que aquilo acabasse, implorando para ele fugir enquanto ainda podia. E a dor que queimava em cada célula do seu corpo somente o lembrava de quanto ficava mais difícil suportar cada dia, a marca em sua costela já aparentava, seu rosto ardia, sua garganta parecia ter sido rasgada por suas tentativas de respirar, cada briga era como estar se aproximando de um penhasco e não ser capaz de parar enquanto dava um passo de cada vez em direção a borda.
Depois que você chegasse na ponta e desse mais um passo, seria impossível voltar, impossível fugir de uma queda mortal. Uma voz soou em seu inconsciente ‘isso quer dizer que você ainda é capaz de dar a volta e fugir… Não deixe ele te destruir…’. Ele sabia disso, mas o que ele poderia fazer? Não conseguia fugir e tinha medo demais para isso, o que ele poderia fazer? Pedir ajuda? A quem?
Por um momento a imagem do rosto sorridente de Dowan passou por sua mente, como ele foi capaz de desafiar Hyuk e em como se sentiu quando estava na companhia do homem.
Não…
Ele não podia pensar em mais alguém…
Não podia ter esperanças de nada…
Ele tinha que continuar.
Juntar todas as suas parte quebradas, colocar sua máscara e sobreviver,
Sem ser capaz de pensar em mais nada além da dor que o afligia, ele apenas abraçou seus joelhos e chorou.
[…]
Dowan estava parado olhando para porta por onde o casal havia passado, talvez estivesse ali a minutos, mas sentia como se parecessem horas. Por algum motivo seu coração estava dolorido, como se algo terrível houvesse acabado de acontecer, bem, por algum motivo sentia que estava irritado ao ver aquele pequeno gatinho ser arrastado por um lobo mal, não, não podia chamar aquele ser desprezível de lobo, seria uma ofensa aos pequenos filhotes que o esperavam em seu apartamento. Talvez um rato fizesse mais sentido, já que o homem parecia ser tão nojento quanto um, mas nem o pior rato poderia ferir um pobre gatinho, a menos que realmente estivesse desesperado. E isso era o que o jovem parecia, desesperado. Infelizmente, são os animais desesperados que mais causam estrago.
E sua mente vagou, focando em um pequeno detalhe que não lhe passou despercebido nesse encontro, as mãos do pequeno e adorável gatinho que o cativou no primeiro olhar trocado tremia segurando o pulso do namorado nojento. E então o rosto de Dowan se fechou, temendo pela segurança do garoto. Apesar de outro detalhe não ter fugido de sua observação, esse tremor parou quando seus olhos se encontraram novamente, a sensação de superioridade ao rato desesperado apareceu em seu peito.
“Hyung, vai ficar aí fora pra sempre?” A voz de Junho soou o trazendo de volta para o mundo real, o homem apenas sorriu e seguiu para dentro. Não poderia ficar focado nesse garoto lindo de cujo o qual não sabia nada. Ele tinha que voltar para dentro e foi isso que fez, mas aqueles olhos tão escuros e brilhantes quanto o céu noturno sempre voltavam para o assombrar.
“O hyung está com uma cara pensativa desde que entrou, o que houve?” Era raro seu chefe e irmão de consideração ficar distraído com algo e isso preocupou Junho por um momento.
“Encontrei um gatinho escondido nos fundos do restaurante…” As imagens daquele pequeno encontro voltaram a sua mente enquanto olhava para uma pequena pétala em suas mãos, que havia caído em suas vestes. “Ele tem um dono, mas não parece ser um bom dono, pelo menos não pela forma que aquele gatinho me olhou quando o dono apareceu e isso me traz uma grande vontade de roubar aquele gatinho para mim…” uma pétala retirada de sua roupa foi apertada entre os dedos em um leve carinho antes de ser soprada para longe.
“A gente pode ir em um petshop comprar um gato pra você hyung, de presente de boas-vindas!” A voz sonhadora de Inho surgiu tão animada como sempre. “Não, espera. Você tem bichinhos de estimação de mais. Vai que um dos seus lobos come o gato?” Como uma criança horrorizada com a própria imaginação, ele abraçou a si mesmo e tremeu fechando os olhos com força.
A cena foi tão adorável que fez Dowan sorrir, quando o Hwang de cabelos vermelhos não estava sendo um pirralho provocativo, ele era realmente muito fofo. Bem, era verdade que tinha alguns animais de estimação, três lobos, que lhe custaram muito dinheiro para trazer ao país e ainda mais para manter, afinal. a carne em si já é cara para um homem adulto, imagine agora alimentar três lobos? Com cada um consumindo até 10kg de carne por refeição. Normalmente ele não se importava muito com animais, mas os seus eram diferentes, Dowan daria a sua vida por qualquer um deles sem pensar duas vezes.
Quando encontrou seus lobos estava na Rússia no ano de 2015 em busca de aliados e ajuda para lidar com a ligação de seu pai com a Organização Bratva, aquele havia sido um ano difícil para ele após a morte de Jisung e o acidente, que ele ainda desconfiava ter um dedo de seu pai mesmo que não tivesse sido capaz de provar, e estava decidido a destruir qualquer resquício de poder que seu patriarca possuísse, mesmo que isso levasse toda a sua vida ou causasse sua morte, não importava.
E foi assim que em um dia no meio do inverno rigoroso da Sibéria em que a aurora boreal brilhava no céu iluminando o caminho com sua beleza resplandecente Dowan os encontrou. Havia acabado de sair de um encontro com o atual chefe da Organização Mikhailov, provavelmente a maior da Rússia atualmente, e um ex-KGB, em seu esconderijo localizado nas montanhas Khibiny e depois de quase uma semana negociando com o homem de avançada idade, havia conseguido o convencer a cooperar, pois se os Bratva se aliassem a Touji seria um problema para eles também.
Mas enquanto encarava toda aquela neve pela janela do Jeep Wrangler pensando em como agora o comercio ilegal que o Presidente Ikira tinha com o pais seria completamente cortado, alguns uivos que mais se pareciam com um choro sedento chamaram a sua atenção em meio aquela vastidão branca com algumas poucas árvores. A ordem para a parada do carro foi clara e severa. A neve fora do carro devia ter cerca de 30 centímetros de espessura e ainda assim ele caminhava, e enquanto seus pés se afundavam na neve e seu grande casaco de pele se arrastava no chão, Dowan procurava a origem do som. E quando encontrou…
Céus, era uma cena tão triste de se ver.
Quase impossível distinguir se havia algo ali se não fosse pelo sangue, agora, seco. Debaixo de um pinheiro haviam três pequenos lobos recém-nascidos, e muito provavelmente, a mãe lobo morta, todos tão brancos que pareciam desaparecer na paisagem. O sangue seco da mãe nos pelos das patas dianteiras e traseiras dos filhotes dava a entender que estavam ali há algum tempo, a loba adulta tinha um buraco de bala em seu pescoço, havia sido morta por um tiro, possivelmente caçadores, e estava conservada pelo frio do inverno, enquanto isso os filhotes choravam com fome e tentavam mamar na pobre mãe morta.
Sem dúvidas uma cena violenta. Dowan não podia deixar aquelas bolinhas de pelo brancas ali para morrerem por inanição, então tirou seu grande e pesado casaco e o colocou no chão transformando algumas centenas de dólares em, nada menos, que uma pequena cama para os pequenos, apesar de ter levado algumas mordidas, que deixaram suas mãos sangrando, os lobinhos assustados ao serem levados para o carro haviam finalmente se acalmado aninhando-se no peito do homem enquanto ouviam seus batimentos cardíacos e sentiam seu calor corporal.
A partir daquele dia, os lobos não saiam de seu lado sob nenhuma circunstância, mesmo quando foi para o exército naquele ano, os lobos ficaram em uma casa próxima ao quartel, para onde sempre fugia, pois os filhotes não eram capazes de dormir sozinhos sem se desesperar, talvez por terem ficado alguns dias sozinhos com o cadáver da mãe haviam adquirido um certo medo do abandono.
Agora, depois de cinco anos, os pequenos não eram mais tão pequenos, cada um pesando mais de 70 kg, mas ainda assim se recusavam a dormir sozinhos. Os três machos haviam sido nomeados por ele, Asashi, Xieye e Haiyan, e eram extremamente brancos com os olhos assustadoramente azuis, como os do dono, e por mais incrível que pareça, tinham um comportamento impecável, adestrados com perfeição. Ele nunca abriria mão dos seus lobos, ‘eu e eles, seres perdidos e sem esperança no mundo que se encontraram por um acaso do destino, era quase poético‘, um curto sorriso escapou de seu rosto com o pensamento.
A voz desacreditada de Junho o tirou dos devaneios. “É claro que ele ta falando de uma pessoa, seu imbecil.”
“Ah!” O som escapou como se sua mente tivesse acabado de conectar às peças. “Faz sentido.” Deu um gole na sua bebida antes de abrir a boca novamente. “Mas é só pegar ele pra você, quem quer que seja o dono dele não tem chance, o Dowan hyung é o mais incrível, é bonito, inteligente, gostoso, rico e acima de tudo…” Levantou o dedo do meio. “Seu pau é abençoado!” E com essa exclamação lambeu o dedo como se simulasse um boquete.
Enquanto o Ikira ria, o gêmeo de cabelos azuis teve sua pequena linha de controle rompida por culpa da brincadeira do irmão, o que resultando em um soco forte na costela do garoto de cabelos vermelhos que o fez lacrimejar e murmurar o quanto o irmão mais novo era cruel, eles eram sempre assim. Inho com suas piadas sujas e sua atitude infantil e Junho sendo a cabeça que pensava pelos dois e sempre batendo no irmão, às vezes por piadas bobas e às vezes por atitudes perigosas. Os dois se amavam e protegiam acima de tudo, era um verdadeiro arranjo de uma irmandade incrível.
“Você é terrível, Inho-ya.” O sorriso de Dowan brilhava satisfeito em passar esse tempo com os amigos depois de tanto tempo. “Mas você tem razão, talvez eu roube ele pra mim…”
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