O Passado do Vilão - Ditado Popular
❝ Por que preocupamo-nos com a morte?
° P.O.V Kim Yuwan °
Uma chuva torrencial caía lá fora. Os relâmpagos chicotearam no céu e rasgaram o véu de escuridão da noite, os trovões abalando a precária estrutura de cimento abandonada na qual eu me escondia. Meu corpo estremeceu e se encolheu em reação ao frio.
‘Porra… eu tô fodido‘
Minha respiração ofegante raspou na garganta áspera, assobiando dentre os dentes cerrados pela dor. Minhas mãos tatearam minha perna, tocando o ferimento aberto cujo sangue quente jorrava fora de controle. Retirei o cinto da calça e apertei como torniquete na coxa, mas essa era apenas uma solução temporária. Não há mais nada que eu possa fazer além disso.
‘Merda… quem caralhos é essa pessoa?!‘
Tentei captar sons de alguém se aproximando ou algum vulto em movimento, mas a chuva me impossibilitou de identificar qualquer coisa. O cheiro de terra molhada, sangue, fuligem e pó estava entorpecendo meus sentidos. Muito tempo se passou desde que estive em um campo de batalha e arrisquei minha vida, muito tempo desde que senti tanta adrenalina bombeando meu coração. Fiquei desacostumado.
‘Sim… isso é loucura, nunca pensei que ia ficar em uma situação assim de novo…‘
Existem alguns ditados populares que são frequentemente espalhados sem qualquer comprovação científica – que eu faça questão de conhecer –, dentre eles: “quanto mais perto da morte, mais vivo você se sente”. Durante muito tempo xinguei mentalmente quem espalhou tal desinformação, afinal enquanto constantemente arriscava minha vida, tudo que eu queria era relaxar e ficar em segurança. Nunca pesquisei a fundo, nunca me dei ao trabalho, já estava sobrecarregado demais.
Até que eu tive que me afastar do serviço.
Não foi escolha minha, não foi concedido a mim devido a méritos, idade ou merecimento. Puramente necessidade, apenas pelo fato de que eu não seria mais capaz de exercer a função estando fisicamente debilitado após um acidente grave.
Pensei que, apesar de tudo, existem alguns males que vêm para o bem.
Pensei que me sentiria melhor.
Mas tudo ficou pior ainda.
Ao perguntar para meus amigos o que eles pensavam sobre, eles brincaram dizendo que eu havia ficado viciado em apostar a minha vida, sentir adrenalina e correr perigo.
Eu disse: ‘vão se foder’.
Quem fica viciado em algo assim?!
É um inferno! Muda a sua concepção da realidade completamente!
É horrível, sério…
…
— … haah… haah… haahah… hahahah…! – sem o meu controle, minha respiração se mesclou com uma risada, os cantos dos lábios se curvando para cima em apreciação.
Levei uma mão ao rosto, cobrindo, ainda que sem parar de sorrir. Meus olhos brilharam, encantados com o sentimento que se reacendeu dentro do meu peito.
Estou sangrando.
Posso morrer por causa disso, ou por hipotermia.
Ou com um tiro na cabeça, por alguém que está me caçando lá fora.
Mas… acho que desde que fui afastado da linha de frente…
Nunca me senti tão bem.
Sinto que antes desse momento eu nem estava vivo de verdade.
‘Caralho… talvez eles estivessem certos. Talvez eu seja um lunático fodido da cabeça, mesmo.‘
‘A morte sempre deixa sequelas na cabeça daqueles que a vivenciaram momentaneamente, ou a viram ceifar outras pessoas.‘
No meio dos meus pensamentos, passos rápidos se aproximam, esmagando a grama e batendo contra o cimento. Escuto alguém correndo, procurando por perto.
‘Essa sensação… de estar vivendo verdadeiramente…‘
Os barulhos ficam mais altos.
‘Acho que a merda daquele ditado…‘
Os passos param.
Na minha frente aparece um homem com uma farda preta irreconhecível e encharcada pela chuva, vestindo um boné e uma máscara. Em suas mãos, uma pistola simples.
Nós nos encaramos.
Um relâmpago serpenteia o céu negro lá fora, iluminando brevemente a expressão do meu futuro assassino. Lançou metade do seu rosto em luz branca doentia, e a outra metade mergulhou em sombras disformes.
Diferente do que se encontra em novelas ou filmes, seus olhos não portavam qualquer intenção. Não havia ódio, empatia, pena ou ressentimento. Para os mais dramáticos e sonhadores, sinto informar que também não havia amor.
Apenas apatia.
Desinteresse.
Sopor.
Talvez um pouquinho de impaciência por ter que ficar procurando o alvo na chuva.
É assim que funciona. Ele está só seguindo ordens de alguém que o mandou me matar.
E agora está prestes a cumprir sua missão.
Ele aponta a arma na minha direção.
‘Aquele ditado popular pode estar certo, mas ainda assim, essa situação é…‘
— Uma merda- – um brilho irrompe, ofuscando minha visão junto de um estouro ensurdecedor que ecoou no local abandonado.
Um tiro na cabeça.
Dor agonizante.
Milissegundos de consciência que parecem horas de puro horror.
Meu corpo deslizando frouxamente.
E então…
Nada.
Eu…
Morri.
Publicado por:

- Sr. Meia-Noite
- Assim como todos os outros, vejo mangás/manhwas/manhuas, comics, novels, animes, doramas e etc. Eventualmente, quis escrever minhas próprias histórias. Espero que goste :):
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