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O fado de Ewan - Capítulo 2: Antes do surgimento da décima lua

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Como num piscar de olhos, dez anos haviam se passado. Agora, o príncipe herdeiro já era digno do título de futuro monarca. Durante todo este tempo, ele mergulhou nos estudos e na arte da guerra. Adquiriu um corpo muscular que fazia as donzelas do reino suspirarem ao passar e conhecimentos invejáveis também. Contudo, era só para manter sua sanidade. Afinal, sempre que fechava os olhos, sonhava com o seu primeiro amor. Era preferível já cair na cama em exaustão sem tempo para fantasiar aquele sorriso encantador.

“Ei pirralho, acorda! ”

(Bocejo)

“Yawn… Primeiro: eu sou pelo menos uma cabeça mais alto do que você. Segundo: Yawn… O sol nem nasceu sua…”

O príncipe jogou um travesseiro em sua serva, que o cortou habilidosamente em dois com sua espada fazendo as plumas voarem pelos ares, enquanto ajeitava um fio de cabelo fora do lugar. Em seguida, prosseguiu tranquilamente ignorando a fúria de seu régio:

“Eu me escutaria se fosse você. ”

“Desembucha”

Era sabido que nunca deveriam acordar sua alteza, pois, o mesmo mal conseguia descansar o mínimo todas as noites. Eliminando qualquer vestígio de penas em seu uniforme de guarda real, Emília relatou calmamente:

“O rei está organizando sua festa de noivado neste exato momento, em segredo. Sua noiva estará aqui em poucas horas. ”

“Mas que porr… ”

Chocado e indignado, imediatamente colocou sua túnica e saiu à procura de seu pai. Abrindo com força a sala do trono real onde o encontrou ocupado em meio a diversos pergaminhos. O monarca disse sem tirar os olhos dos papéis:

“Vejo que já está sabendo das boas novas. ”

“Eu disse ao senhor milhares de vezes que eu não tinha intenção de me casar por enquanto! ”

O soberano tirou os olhos brevemente dos pergaminhos para corrigir as palavras de seu filho.

“Para ser mais exato, você disse que não se casaria NUNCA. ” Depois abaixou o olhar novamente e continuou enquanto lia. “Mas é seu dever gerar herdeiros para dar continuidade à linha da família, querendo você, ou não. ”

“Eu não vou me unir a alguém que nem conheço. Se um dia isso acontecer, será com alguém que eu amo. ”  

“Para de agir como uma maldita donzela da plebe! A realeza apenas cumpre silenciosamente com as obrigações da coroa! ”

“…”

O tom de voz do rei tinha se alterado neste ponto. Sua alteza sabia muito bem a hora de se retirar, pois, seu pai tinha o coração fraco além de ter aberto mão da mulher que mais amou no mundo em prol de seus deveres. Então, o príncipe cerrou os punhos e saiu enraivecido do salão.

“Emília, prepare mau cavalo. ”

“…”

Quando deixou o castelo, o dia já havia clareado. Era a primeira vez que ele saía sem sua fiel companheira. Mesmo que ele tivesse se tornado um homem digno de confiança, o evento era importante demais para haver quaisquer imprevistos, por isso, o soberano mandou que guardas o trouxessem de volta.

 


 

Depois de horas cavalgando incessantemente para fugir dos seus homens, sua raiva não havia se apaziguado, mas o pobre cavalo estava muito cansado, então, ele desistiu de fugir. Amarrou o cavalo onde o animal pudesse pastar e tomar água enquanto aguardava sua escolta. De repente, percebeu um brilho conhecido por entre as árvores e seguiu vagarosamente naquela direção.

“Não pode ser… ”

Como numa miragem, o palácio perdido surgiu no horizonte. Ao ouvir os cascos dos cavalos dos guardas, ele se apressou em seguir naquela direção a pé mesmo.

“Eu sabia… Eu sabia. Eu sabia! ”

Enchendo-se de regozijo, o infante correu sem parar até chegar em seu destino. Faltava pouco para o pôr do sol quando ele finalmente adentrou a porta de seu amado, sem bater.

“Haha vejo que ainda não consertou esse seu hábito, príncipe Eoin da casa de Gradaigh. ”

A beldade se encontrava virada em direção à varanda e assim continuou.

“Ah, arf! d-desculpa… você se,se lem-bra… mim? Eu… Eu… é que… Arf! ” Tentava falar completamente sem fôlego.

“Que tal respirar primeiro e se desculpar depois? ”

Neste momento, o jovem se virou com aquele sorriso encantador, que havia assombrado os sonhos do infante por uma década. Com exceção, de que agora lhe causava apenas felicidade genuína.

“Rabanetes…”

“Como? Haha”

“Você continua… tão lindo… parece que não envelheceu nada”

(Risos)

“Não é porque minha aparência não mudou, que o tempo não tenha passado. Olha só pra você, se tornou um belo homem. ”

Ruborizado, o príncipe se sentiu honrado com tais elogios pela primeira vez em muito tempo. Depois, a culpa recaiu sobre seus ombros.

“Lamento… Prometi lhe visitar com frequência e te trazer um presente, mas… quando tentei achar este lugar, não consegui. Achei que eu tinha apenas sonhado… Você… é real? ”

“Me toque e saberás. ” Disse o rapaz sorrindo suavemente enquanto estendia o braço.

Aproximando lentamente, como que com medo do encanto se desfazer, Eoin tocou seus dedos. Sentindo a firmeza da carne, segurou aquela mão delicadamente.

“Tenho sonhado com você sempre que fecho meus olhos, desde que nós nos conhecemos. Como eu ansiei poder conversar contigo… te tocar… sentir seu cheiro…”

Disse isto se aproximando mais e tocando o rosto do seu amado de forma muito romântica enquanto segurava as lágrimas.

“Bom, estamos aqui agora, não? ”

E após limpar as lágrimas que começaram a cair, o rapaz iniciou um beijo apaixonado. Como se fogos de artifícios decorassem o céu abençoando aquela união, ambos aproveitaram o momento se embriagando naquela paixão a noite toda.

 


 

O dia já estava quase amanhecendo e os pombinhos ainda se encontravam aninhados nos lençóis. Sua alteza então tirou seu anel e colocou no dedo do amado.

“Isso não é seu anel real? Desculpa, não posso aceitar. ” Falou devolvendo a joia. Mas, foi impedido.

“Esta é a prova da minha sinceridade com você. Casa comigo? ”

“…”

O semblante do jovem não era nada animador. Ele parecia profundamente triste.

“O que foi? Você não… gostou? ”

“Eu realmente não posso aceitar. ”

“Mas… Por que? Você já está comprometido? Você não me ama? ”

“Não é nada isso” Balançou a cabeça fervorosamente em negação.

“Então me fala por favor. ”

“…”

O silêncio era mortífero.

“Me responde! É sobre você não poder sair daqui? Não tem problema. Já pensei sobre isso e se for necessário, renego meu nome e me mudo pra cá! Não me importo com mais nada desde que eu tenha você comigo. ”

“Não é tão simples assim…”

“Então me fala! Eu juro que não importa o que seja, eu irei aceitar. ”

“Desculpe, não posso. ”

“Pelo menos me fala o porquê, droga! ”

O príncipe estava claramente alterado quando se levantou da cama para vestir sua túnica. Como isso raramente acontecia, demorou a perceber que cerrara os pulsos com força demais enquanto andava em círculos pelo cômodo. Percebendo que o sangue começava a escorrer, o jovem pegou em sua mão para limpar o ferimento com um lenço de seda, deixando quase todo o seu corpo despido, exibindo suas marcas de amor.

“Eu só preciso de um tempo, ok? ”

“Quanto tempo? Meu pai está neste momento armando uma festa de casamento para mim…”

“…”

“Não importa, me diga quantos dias, eu vou te esperar. ”

“Nove luas. Antes do surgimento da décima lua, você deverá estar aqui. Não antes, nem depois. ”

“É muito tempo… Demorei tanto para te reencontrar…”

“Esta é a minha condição. Aceita? ”

“T-tá, tá! Tudo bem, eu já disse que faço qualquer coisa por você. ”

Finalmente o sorriso havia voltado aos lábios de Ewan, que levantou enrolado no lençol e foi até sua penteadeira. Pegou um colar e deu ao príncipe.

“Este é o colar da minha família que ganhei ao nascer. Como estarei em posse do seu anel até ser capaz de te dar uma resposta, quero que fique com ele em troca. ”

O príncipe olhou brevemente e ficou fascinado com o brasão. Certamente não pertencia a um plebeu que achou este castelo abandonado e fez dele o seu lar, como imaginara.

“Prometo cuidar muito bem dele. ”

Ewan sorriu e então trocaram mais alguns beijos antes de se despedirem.

 


 

De volta ao castelo, se deparou com um rei nada furioso como pensou que seria.

“Você me deve uma, sabe Deus como foi difícil acalmar a fera. ”

“Obrigado Emília. ”

“Prefiro o agradecimento em peças de ouro”

Pow! (Baque)

“Ah, me desculpa! Perdoe a minha indelicadeza. Como sou desastrada! ”

Alguém havia se chocado com o príncipe enquanto fugia de sua dama de companhia.

“E você é…?”

“Princesa Catherine d’Ambray. ” Disse fazendo uma reverência elegante.

Não era comum ver um nobre, ainda mais uma princesa, se curvando sem saber quem estava diante deles. Claramente essa pessoa não se importava com status social. Olhou para Emília procurando por sinais de que ela soubesse de quem se tratava e a pegou ruborizando e fazendo uma cara esquisita que nunca havia visto antes.

“Vocês se conhecem? ”

“Não necessariamente, a vi pela primeira vez ontem quando vossa alteza saiu em uma busca. ”

“Ah! Você é o meu noivo? ” Disse ela curiosa.

Eoin fez uma careta de desprezo. Essa palavra soava muito amarga em seus ouvidos naquele momento.

“Escuta, isso tudo foi coisa do meu pai. Não adianta criar expectativas. Nunca irei me casar com você! ”

A princesa sorridente pareceu contente em ouvir aquelas palavras.

“Ótimo! Pois eu também não tenho interesse em me casar! Só precisamos fingir, oras! ”

O príncipe achou aquela garota muito esquisita, mas, aceitável. E para apaziguar o soberano e não causar conflito entre ambos os reinos, o noivado continuou.

 


 

Conforme os meses avançavam, Eoin mergulhou nos pergaminhos e livros em busca de respostas. Ele queria saber a qual família pertencia o tal brasão. O que não foi uma tarefa nada fácil. Quem entretia a princesa enquanto ele estudava para que ninguém ousasse repreendê-lo, era sua serva Emília, que estava sendo muito bem paga. Vários meses depois, ele encontrou o que procurava.

“Rabanetes! Finalmente! ”

Era um livro gigante com a árvore genealógica da família de Grandmesnil, a história de vida dos monarcas e do tal reino perdido. O príncipe levou dias, dias e dias para terminar de ler tudo e depois disso, parecia ter feito um voto de silêncio. Não interagia diretamente com as pessoas sem necessidade, o que foi motivo de fofoca no reino. Contudo, ele não se importava. Continuava sempre em seu mundinho de pensamentos.

“Sabe, as pessoas estão fofocando horrores sobre você ficar sempre no mundo da lua. Ouvi até dizerem que você está doente da cabeça…”

“Argh…”

“Isso na sua cabeça é um fio de cabelo branco? Disse surpreso enquanto arrancava o tal fio, irritando ainda mais sua alteza. ”

“Emília minha querida, você não tem uma princesa para cuidar, não? ”

“Tivemos… bem, um pequeno… desentendimento. Estou dando espaço para ela. ”

“Ah, aí você decidiu vir me perturbar? ”

“Não, eu vim te chamar para lutar. Tem meses que você não sai da biblioteca. Aposto que nem consegue mais segurar uma espada. ”

“Há! Dessa vez vou ter que recusar. Tenho um compromisso amanhã e preciso poupar todas as minhas energias. ”

“Compromisso? ”

“…”

“Tá, saquei. Até mais então”

Deixado novamente perdido em pensamentos, o príncipe não aguentava a ansiedade em poder rever seu amado. Uma parte de si se preparava mentalmente para dizer adeus a todos do seu reino, pois, se ouvisse um sim, abandonaria a coroa imediatamente. Outra parte de si, só desejava desesperadamente confrontá-lo logo sobre os relatos achados nos arquivos.

Publicado por:

@yani.nsfw
Ilustradora, escritora e fujoshi de carteirinha 💋
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