Missão Ágape - Capítulo 47
Foi uma noite tranquila… Mais ou menos…
James pensava que depois de todas aquelas coisas, que pudesse ter alguma dificuldade por estar tão perto daquele deus, mas foi o contrário.
Estar perto dele lhe fazia se sentir seguro, e aquela paz que havia sentido quando estava no mar era parecido ali enquanto o outro dormia no chão da cabine, enquanto que ele usava a cama, que era estreita e bem desconfortável.
Estava acostumado a colchões de pena, e lençóis egípcios dos mais finos e macios tecidos de algodão, então dormir num que era feito de palha não era algo nenhum pouco agradável, pois algumas vezes pinicavam as costas, justo a região que tinha que se curar. Aquela onde a asa mal feita tinha crescido e sido decepada por Ares numa ação de salvá-lo.
E parece que a ferida se abriu de novo nos enfrentamentos lá no Monte Fuji…
Por isso, preferiu dormir de bruços, mesmo que fosse ser seu rosto ou barriga sendo espetados pelas palhas que transpassavam o tecido, que nada mais era do que um monte de retalhos de várias cores, um verdadeiro trapo. Mas pelo menos estava limpo, ou então preferiria dormir pendurado na proa do que estar deitando num cobertor que poderia estar sujo com coisas “indefiníveis”.
Por um momento, por pouco, quase não desceu para o chão para se deitar ali ao lado do deus, mas seu senso de auto preservação falou mais alto, e preferiu superar as adversidades daquele colchão de classes inferiores.
— Bom dia, James. — Lhe sorriu o deus, sentado recostado contra a parede da cabine. Parecia comer algo enquanto lia alguma coisa sobre pescar tubarões.
— Bom dia? — olhou para a pequena janela redonda, vendo que ainda estava escuro — Que horas são?
— Pelo fuso horário, são seis da manhã.
— Seis? Parece que são quatro ainda… — bocejou, de sentando na cama, sentindo seu corpo todo dolorido, e fazendo uma careta quando sentiu uma fisgada vindo da ferida em suas costas.
— Está tudo bem? — perguntou o deus muito preocupado com a aparência meio pálida do moreno.
— Sim, estou. Acho que só dever ser o movimento do barco começando a me dar enjoos… — respondeu, mesmo que na verdade nunca tivesse tido problemas em ficar enjoado em alto mar. Quantas vezes foi passear de barco nas férias de família e tentar fazer uma boa pescaria quando seu pai lhe obrigava a ir junto fazer essas interações de pai e filho, com seu pai lhe dando longas palestras de como ser um homem de respeito. Aliás, a única coisa que tinha medo era de mergulhar, pois sempre tinha a sensação de ser puxado, mas nunca acontecia, só se afogava por causa do pavor daquele pensamento.
É, “maravilhosos” passeios…
— Hm, entendo. Então eu tenho uma boa notícia para isso.
— Boa notícia? Ah, fala-me logo, faz tanto tempo que não escuto alguma.
— Falei com o capitão, e ele me disse que atracaremos ao meio dia em Brisbane. Uma colônia de seu país que fica na Austrália.
— Uma vez estudei que esse lugar já era bem populoso antes da chegada dos britânicos. Espero que não tenhamos chegado em maus dias. Não quero ser estraçalhado por aborígenes.
Kýrios sorriu e ergueu uma mão em direção ao rapaz, lhe oferecendo uma fruta.
— Coma.
— O que é isso? — perguntou ao ver uma fruta de cor roxa, e bem vermelha por dentro.
— Figo. Nunca viu uma?
— Não assim, natural. Só via enfeitando doces ou como geleia.
— Está bem docinha. Vai gostar assim in natura. — disse, ainda com o braço estendido.
— Aonde arranjou?
— Tinha comprado quando estava no Japão. Tinha me esquecido que eu tinha alguma ainda em minha bolsa. — respondeu, parecendo esconder alguma informação à mais.
Meio desconfiado, mas aceitando mesmo assim por conta de estar com muita fome, ergueu a mão para pegar a fruta.
Como se uma corrente elétrica tivesse passado pelo seu corpo, James disfarçou, se afastando um pouco mais para trás e se recostando na parede quando a ponta de seus dedos tinha encostado na palma da mão do deus.
Era quente, e parecia emanar uma energia muito boa que o fazia se sentir eufórico, lhe fazendo esquecer um pouco da dor em suas costas.
Mas assim que foi passando o efeito da tal eletricidade, aquelas incômodas dores lhe invadiram, deixando-o com uma sensação de que estava ficando doente.
Tentando outra vez não pensar nessa sensação, deu logo uma mordida na fruta, sentiu a sensação carnuda, que por estar bem maduro, tinha um sabor muito doce e uma consistência quase suculenta.
Sem querer soltou um gemido de satisfação por deliciar-se e por se surpreender em gostar da tal fruta naquele estado natural.
— Bom não é? — o deus lhe mirava fixamente.
— Sim, muito bom… — respondeu, mordendo outro pedaço — Espero que tenha mais, pois só esse figo não vai me satisfazer.
— Sinto muito, com esse eu só tenho mais dois. Mas, posso satisfazê-lo com mais outras coisas que eu garanto que vão lhe tirar a fome. — disse o deus, se voltando pro livro de pesca.
James engoliu em seco. Ao encarar o deus, via que o mesmo não estava nenhum um pouco com segundas intensões em suas palavras enquanto as proferia. Kýrios tinha até levantando e se aproximado indo em sua direção, mas quando viu o real motivo de sua ação, ficou com uma sensação estranha de decepção.
O deus tinha ido pegar sua bolsa e voltou para o mesmo lugar para se sentar, se pondo a procurar por algo dentro dela.
“Essa bolsa estava ali todo esse tempo?” Perguntou-se, olhando para o canto onde estava escondido, e era por isso que estava deixando a cama irregular.
Esfregando o rosto um pouco com as duas mãos de modo um pouco irritadiço, se levantou, terminando de comer o figo.
— Pronto, vou banhar-me.
— Quer alguma ajuda?
— Porque eu precisaria? Não sendo indelicado, claro. Eu só…
— Não sei… Você me parece mal. Tem certeza de que está tudo bem?
— É claro que estou. — disse, respirando fundo, mas se esforçou para não tossir por conta de sentir uma outra fisgada vinda de suas costas, dessa vez parecendo que a dor vinha mais do fundo — Me sinto bem disposto.
O deus lhe mirou analítico, mas se deu por convencido no fim para não chatear o moreno.
— James, se precisar de qualquer coisa, qualquer coisa mesmo, não hesite em me chamar. Estarei lá no convés em dez minutos, vou esperar por você para tomarmos o nosso dejejum juntos. O capitão deve estar já preparando algo agora nesse momento.
— Certo. Serei rápido então. Obrigado pelo fígado. — disse dando um pequeno sorriso sofrível, passando pelo deus, que lhe sorriu amigável, voltando sua atenção para o livro de pesca marinha.
Havia um lugar lá trás no barco, que era coberto somente com uma cortina um aro de aço que o dono da embarcação colocou anexado na ponte, mais precisamente, no telhado-chão que separava a ponte do segundo andar com a cabine logo abaixo.
Ali dentro tinha um barril com água do mar. James sabia que sua pele ficaria bem ressecada, mas a sensação de sentir-se limpo era maior que a preocupação disso.
— Droga… — reclamou, quando depois de encher a caneca e jogar sobre seu corpo, a água cair para trás e deslizar logo em suas costas, sentiu uma ardência muito forte bem no local daquele ferimento.
“Porra, o que está acontecendo? Porque isso não está me atormentando de novo?” Pensou.
Isso era uma coisa que estava começando a deixar-lhe preocupado…, mas uma coisa que lhe deixava mais tranquilo era não sentir febre, apesar do mal estar constante que o fazia ter sempre aquele sentimento e vontade de ficar deitado na cama.
Mas, não havia cama para ele repousar para sentir-se melhor. Acreditava que se deitasse aí sim daria chance para uma fase acamada.
Com muito cuidado e usando o sabão feito somente com gordura bovina, tomou seu banho, e se encaminhou para o convés principal, aonde já estava Kýrios ali do lado do capitão japonês, que por sorte falava a língua deles de tanto que fazia entregas de suas mercadorias nas rotas que ele tinha e passava entre o Japão e a Austrália para os colonos ingleses.
— …então quer dizer que os aborígenes fazem isso? Vou ter cuidado com isso então, obrigado pela informação capitão. — disse o deus, apoiado contra a amurada.
— Mas isso não é tudo. Há muitas outras coisas. Uma vez eu vi um monstro terrível que eles invocaram para espantar os ingleses. Eu vi com meus próprios olhos um bicho muito grande, um homem macaco gigante destruindo toda a base deles! — disse o ancião, enquanto fervia algo dentro de uma pequena caldeira ali perto da amurada e outros caixotes.
— Hmm… O cheiro está muito bom. — comentou James, se aproximando.
— Que cara feia é essa? Parece um Anago pisoteado! — comentou o capitão.
— Ele tem razão James, você está com uma aparência horrível… — concordou o deus, cruzando os braços, olhando-o preocupado.
— Vocês estão exagerando. Eu não estou tão mal assim. Estou me sentindo muito disposto, pra falar a verdade. — Encheu o pulmão de ar, sentindo uma dor terrível nas costas, mas disfarçando com um espreguiçar tentando ocultar a careta — O que temos para hoje? — perguntou, tentando desfocar a atenção de si.
— Polvo cozido e batatas. E mais algumas coisinhas que comprei nas Filipinas… algo bem nutritivo. — respondeu o loiro, ainda olhando analítico para o rapaz, tentando captar ainda alguma mentira no moreno.
— Minha mãe quem me ensinou. Vocês vão gostar! Os ingleses sempre gostam quando eu faço para eles nas vezes que estou atracado no porto entregando minhas encomendas.
— Deve ser bom. Bem exótico. Nunca comi. Com certeza não deve ser pior que escargot. — disse, fazendo uma careta enojada e se aproximando da pequena caldeira para ver os ingredientes que o capitão cozinhava ali dentro — O que é isso? — apontou para uma carne comprida flutuante entre outros ingredientes.
— Falo de touro.
— O que disse? — perguntou, pensando ter ouvido errado.
— Falo de touro. — O capitão elevou e abaixou seguidas vezes as sobrancelhas e deu uma pequena e leve cotovelada em seu braço, indicando um gesto malicioso — É para ter mais forças. Vigor! Vou ficar uns dias lá em Brisbane, quero me divertir também.
— Então… Vamos comer falo de touro. É tipo… o pau do boi? Vamos comer o pau de um boi? — Engoliu em seco, se afastando um pouco por sentir seu estômago embrulhar pela imagem de estar comendo logo aquela parte bovina.
— Na Bolívia servem isso também, James — começou o deus, se aproximando da caldeira e inspirando o aroma das especiarias e das carnes que haviam ali dentro — Ah, que aroma… Não se preocupe, eu já comi várias vezes falo de touro, é realmente muito gostoso. Um pouco duro, mas depois de um bom preparo e manejo bem experiente na carne, fica bem molinho depois. Bem suculento para ser degustado. É uma sensação estranha quando você o coloca na sua boca e sente o gosto um pouco almiscarado. Mas depois se acostuma com o sabor delicioso que as especiarias proporcionam na mistura. E é realmente bem “afrodisíaco”, como vocês falam.
James ficou com as bochechas queimando, sentindo uma leve sensação de frio na barriga que ia descendo e esquentando para o meio de suas pernas com aquela descrição tão detalhada de uma comida. Por um momento, ficou se perguntando se o deus estava fazendo de propósito ou se era a sua mente suja imaginando coisas aonde não tinha.
— Deve ser muito bom… Mas mesmo assim… Acho que vou somente me arriscar no polvo. — disse, coçando o pescoço por se sentir nervoso de repente, já que aquelas borboletas pareciam teimar em ficar ali em sua barriga.
— Você é quem sabe. — disse o capitão — Eu vou é me preparar! Tenho muitos dias de folga então quero aproveitar muito! Vocês vão adorar Brisbane, há muita mulher linda! — disse dando breves risadas, acrescentando um pouco mais de sal e depois experimentando o caldo do cozido — Está pronto! Sirvam-se!
E assim como indicou, cada um pegou seu prato, que era um daqueles para sopas, mas que para o capitão servia para qualquer tipo de comida.
O dono da embarcação pegou vários pedaços de polvo e um falo para si, o deus somente pegou a carne exótica, e James, somente os pedaços menores de polvo junto de outros legumes.
O capitão e o deus pareciam ter bastante prática em comer os dois tipos de carne, já o rapaz… Não sabia nem por onde começar com seu polvo. Ainda mais quando só tinha uma colher para servir de apoio para comer.
— James? — lhe chamou o deus, vendo o mesmo ainda não tocar na carne e somente ter comido os vegetais.
— Sim?
— Algo de errado?
— Não, é que… — olhou para seu prato, o polvo parecia menos atrativo do que quando estava dentro da caldeira fervendo.
— Se quiser, ainda dá tempo de comer outra coisa. Ainda tenho metade do meu. Quer meu falo para você?
E mais uma vez, as bochechas arderam…
— N-não, obrigado. — disse, engolindo em seco quando seus olhos passaram rapidamente pela virilha do loiro, que por causa da calça ser bem frouxa e de um pano consideravelmente fino, além do deus que parece não ter costume de usar peças debaixo, deixava bem evidente seus… atributos — Eu só estou criando coragem para esta nova aventura culinária. Só isso.
— Bom, você é quem sabe. Mas tenho que dizer, está perdendo. — disse o deus pegando com a ponta dos dedos das duas mãos a metade cortada do falo de touro cozido e levando à boca justamente a parte da glande temperada e cozida entre os lábios.
Cada momento foi captado, e James não conseguiu fazer seus olhos desgrudarem daqueles lábios carnudos envolvendo a carne, e empurrando um pouco para dentro para poder ter seu pedaço. E quando o deus conseguiu obter uma porção, um caldo esbranquiçado e cremoso da batata escorreu pelo canto da boca.
— Porra do céu… — xingou baixinho.
— Hm? Falou alguma coisa James? — perguntou, ao dar-se conta de que o moreno lhe mirava com um rosto muito corado, mas o mesmo negou, ainda lhe encarando — Acho que a sopa está te fazendo bem. Seu rosto ganhou até mais cor! Que bom, assim fico menos preocupado.
— Ah, sim, é, a sopa está muito boa… — disse, desviando seus olhos para seu prato. E respirando fundo, tratou de fazer igual a como os outros dois faziam: pegar com a mão aqueles pedaços de carne estranhas e comer de uma vez por todas.
“Porra James! O que é que você está pensando?!”. Perguntou-se, sentindo seu corpo ficar meio trêmulo pelos pensamentos impuros bem inconvenientes para o momento. Para sua sorte, estava sentado atrás do caixote, e poderia esconder uma certa inconveniente firmeza lá embaixo…
O café da manhã foi desafiador, mas depois tudo ficou mais calmo, ainda mais porque o deus parecia estar entretido nas histórias e orientações que o capitão dava enquanto estava no timão, falando sobre como era sua rota e todas as aventuras perigosas que passava pelo mar.
Esse tempo deu a James a oportunidade de ficar observando o mar, e também pensando numa lista de coisas que gostaria de fazer quando estivesse em terra, se focando em esquecer dos assuntos importantes como o desenho da nova pista, das cenas de Psiquê e daquele rapaz naquelas visões, e também em seu coração, cada vez mais batendo forte por um certo ser alado.
— O sol está ficando cada vez mais quente, melhor se proteger, James. Ou então vai ficar todo queimado e com insolação. — disse o deus, chegando ali e ficando inclinado e apoiado na murada assim como o rapaz estava.
— Hm, estou tentando pegar um pouco de vitaminas, não vou ficar aqui por muito tempo. Além do mais… Acho que seria legal ficar mais bronzeado, tirar essa palidez inglesa de mim… — respondeu, ainda olhando para aquela imensidão de água.
— Pra ser sincero, acho você bonito do jeito que é, James. Gosto dessa sua “palidez inglesa”. — disse, olhando para o horizonte — Quando olho pra sua pele me lembro dos Kourabiedes. Ah… Me dá água na boca.
— Perdão?
— São biscoitinhos polvilhados com açúcar de confeiteiro. Só de lembrar me faz querer comer uns cem deles. É uma receita de meu povo. — Se apoiou com os cotovelos na amurada, sua expressão sonhadora, nem um pouco mostrava alguma malícia, somente nostalgia e saudades de casa.
James esfregou o rosto, tentando discretamente abanar-se por sentir um calor repentino mesmo que a brisa estivesse fresca.
— Sinto falta deles. — disse de repente o deus.
— Ah, eu também. E antes que fale algo sobre isso, eles dois estão bem, você vai ver.
— Está desenvolvendo alguma mediunidade de seu domínio ou está virando um servo de Apolo e eu não estou sabendo? — perguntou, brincando.
— Servo de Apolo?
— É, virando um oráculo.
— Ah. Entendi… Me desculpe, algumas informações de seu domínio ainda me escapam. Pensei que ele fosse somente o deus da beleza.
— É deus de muitas outras coisas também. Mas não vamos ficar falando nele. Vamos falar sobre a gente.
— A gente?
— Sim. Na nossa ajuda mútua, James. — disse, desviando seu olhar pra baixo, como se quisesse indicar algo não bom.
— Kýrios, não me diga que está querendo voltar atrás?
— Eu venho pensando… — disse, parecendo estar criando alguma arteirice — E se eu tentar novamente? Quem sabe essa próxima pista ela tenha me deixado realmente algo pra mim.
James fechou os olhos e respirou fundo.
— Não.
— Não o quê?
— Não vou deixar você ficar criando falsas esperanças! Olha, eu até poderia lhe falar agora que sim, que eu vou te apoiar nessa “próxima chance”, mas tenho que ser sincero, não vou e não quero que fique correndo atrás de algo que só vai te machucar! Mas, claro, isso é minha opinião.
— Você está certo, James. Eu tenho que respirar novo ar, e… trabalhar para me libertar disso. Acho que… Bem, enfim, você está certo.
— É claro que estou. Por isso, já estou pensando em tudo o que vamos fazer quando chegarmos na Austrália.
— E você conhece por acaso os lugares de lá?
— Não. E nem preciso. Porque para essas coisas que estou planejando, não se precisa conhecer o local, basta só perguntar onde fica e partirmos para a caça! Então, em vez de ficar perdendo tempo pensando em coisas depressivas, pense em como nós dois vamos nos aventurar em lugares desconhecidos, colecionando novas experiências… Hm… Sabe, tenho uma dúvida.
— Qual?
— Deuses podem se relacionar com outros deuses de outros domínios?
— Hm, acho que sim…, mas isso é uma raridade, uma chance de um em um milhão. Talvez nem há.
— Excelente.
— Porquê?
— Porquê? Imagina se encontramos uma deusa para você? Uma que seja do domínio de lá? E não estou falando que você tenha que fazer um acordo de algo mais sério, só diversão mesmo. E claro, que deixe bem claro isso antes de qualquer coisa.
— Hm, creio que não terei essa sorte. E mesmo que eu tivesse, não quero me relacionar com deusas.
— Ótimo! Que seja as humanas!
— Eu… Também não queria humanas.
— Humanos?
— Hm… — o deus suspirou encarando o moreno, e desviou seu olhar pro mar.
— Por favor, espero que não esteja pensando em algo nojento e bizarro. Se é um fetiche que vá me envergonhar eu prefiro não saber.
— Oh não! Claro que não! Não sou um deus nórdico… Eca.
— Que bom. — Se sentou no caixote, ficando de frente para o deus — Certo, se não quer esse tipo de diversão, há outras possibilidades que podemos explorar.
— Quais? — perguntou o deus, virando seu rosto de maneira muito interessada.
— Uma vez eu fui numa casa de massagens. Sabe, aqueles tipos de “massagens”… O único contato será com as mãos, você não precisa se relacionar nem nada com a pessoa.
— Está propondo que eu me sujeite a ter mãos estranhas em meu corpo e me masturbando?
— Isso te incomoda?
— Não, bom, sim, quer dizer… eu preferiria mãos conhecidas…
— Isso dificulta as coisas… Mas não é impossível. Talvez o capitão conheça alguém de confiança, aí você conversa por algumas horas, leve a pessoa para comer… vou perguntar para ele assim que chegarmos.
— Não, não… Não precisa. Como você disse, há outras coisas para serem exploradas. Me conte mais o que planeja. Além dessas casas de massagens.
— Hm… Como vamos para uma colônia inglesa, tenho quase certeza que eles têm casa de jogos. Apostas. Corridas de cavalo… Lutas clandestinas. Esses tipos de coisas.
A expressão do deus parecia entediada com todas aquelas sugestões de diversão…
— E se, a gente somente ficasse no barco e esperasse pelo capitão?
— Eu e você sozinhos nesse barco? Não vou ficar aqui e morrer de tédio cheirando a peixe e temperos japoneses. Vamos, Kýrios, será divertido! Eu prometo. Ninguém que tenha me acompanhado em farras lideradas por mim se arrependeu de ter ido.
O deus fungou em derrota, e sorriu de canto.
— Tudo bem. Vou confiar em sua promessa de eventos.
— É assim que se fala, meu caro deus do amor. — disse, voltando a olhar para o mar, animado pelas expectativas de cair em uma noite boêmia depois de muito tempo.
O deus continuou olhando para ele, e um discreto sorriso bobo sem querer saiu de seus lábios.
•
Longas horas se passaram, e por conta de alguns contra tempos marítimos como o leme ficou emperrado, se atrasaram, então ao em vez de chegarem ao meio dia como estava previsto, chegaram lá pelas cinco da tarde, e tudo já estava escuro.
Mas o porto funcionava, havia bastante gente por ali ainda desembarcando ou saindo para o mar.
— Não sabia Austrália era tão quente. — Reclamou, sentindo o ar úmido e abafado da região. Estava preparado para um clima fresco, então tinha colocado uma camisa mais grossa. Mas por sorte, tinha a sua camisa debaixo, então só fez tirar a peça de cima e ficar somente com sua calça de linho de costume e seus suspensórios.
O deus estava mais relaxado, como sempre. Sua calça frouxa de algodão, sandálias de couro marrom e uma camisa fina de manga que enrolou até os cotovelos, tudo em tons beges, e mesmo que fosse tudo muito simples lhe deixava com um ar de riqueza, um dono de algum empreendimento que veio passar as férias e se aventurar em outro país.
— Pode ser que mais tarde fique mais fresco. O vento vindo do mar está meio morno, e com certeza pode mudar.
— Virou um especialista em coisas marítimas? — brincou, recebendo do deu um dar de ombros despreocupados.
— Não. Só estou tentando aplicar o que o capitão me disse. Ainda mais porque, esse lugar é um território que desconheço completamente. Incrível como em todos esses anos eu nunca vim visitar aqui… É bonito. E atraente aos olhos. — disse o deus, olhando curioso para tudo.
— Sério? Hm… Isso é bom, e também não é. — disse James.
— Como assim?
— É bom pelo motivo de que é uma memória nova que você terá e que não tenha “ela”. E não é bom porque qualquer coisa que vier daqui, pode ser que tenhamos dificuldades em saber lidar. Porque eu também não sei muita coisa sobre esse país, nem esta cidade. A não ser que Brisbane é uma colônia inglesa, o que me deixa um pouquinho mais tranquilo, já que com certeza eu poderei me passar por um deles facilmente se algo der errado. — explicou.
— É um bom argumento. — Sorriu minimamente — Sabe, até que estou começando a gostar da ideia de ter novas memórias. Estou começando a ficar um pouco entusiasmado para o que virá.
— Que bom, porque pretendo começar a partir de agora.
— Não me diga que…
— Sim! Já avistei um lugar que possivelmente pode ser promissor! — disse, apontando para um prédio de madeira, e um bêbado foi jogado ali na rua, no meio da lama, e mesmo assim, os transeuntes continuaram com seus caminhos e rotinas.
Apressando um pouco os passos, se encaminhou para o local que parecia ser uma taberna rústica. E assim que entrou pela portinhola, a música animada dos bares de Londres invadiu seus ouvidos.
A cantoria dos que estavam ali era contagiante, e tal sentimento de alegria o envolveu, sentiu seu peito aquecer pela familiaridade. De lar.
— James?
— Sim?
— Está bem? Seus olhos…
— Ah, sim, estou bem… — limpou os olhos do seu marejar, e sorriu respirando fundo — Isso me lembrou de minha casa. Minha Londres… — disse, olhando nostálgico para a bagunça organizada de mulheres seminuas dançado em cima dos balcões, homens em suas mesas bebendo e jogando carteados, e serventes tanto homens quanto mulheres indo entregar as comandas nas mesas. E havia também um músico no piano, tocando alegremente enquanto uma cantora agraciava os ouvidos com sua bela voz naquela canção alegre e cheia de malícia que só era tocada e cantada nesses tipos de lugares.
De repente uma mulher muito sensual, de pele bronzeada em caramelo e cabelos ondulados numa mista cor de castanhos e louros naturais passou, olhando James de cima a baixo e lhe dando uma piscadela sugestiva.
— Deve ser uma local. — disse Kýrios, um tanto sério, cruzando os braços.
— Com certeza… uma linda local… — admirou James, ainda olhando a mulher que havia se sentado no colo de um homem que estava jogando numa mesa ao canto perto das janelas, e pensou que aquele pensamento sobre experimentar o sexo oposto poderia ainda lhe surpreender, pois talvez seu desanimo por todo esse tempo fosse motivada pela obrigação de estar somente com mulheres. Mas agora ele era livre, podia realmente descobrir se gostava mesmo, e finalmente firmar esse seu gosto por elas — Quem diria que eu iria um dia provar das belezas australianas?
O deus franziu o cenho intercalando seu olhar para a moça e o moreno, não gostando de suas interações, e como um deus, já sentindo uma energia de atração ser compartilhada entre ambos, mas tal atração sendo mais forte vindo da mulher.
— Mas já? E quanto ao nosso itinerário turístico? James, você me prometeu que iria ser legal.
O rapaz revirou os olhos, e bufou.
— Sim, sim. Eu prometi. Mas…
— Certo. Aproveite então. Qualquer coisa estarei lá no barco. — Quando já ia se virar para sair, o rapaz puxou seu pulso.
— Dramático.
— Não estou sendo dramático. Só estou sendo prático. Você quer se divertir, e eu apoio totalmente. Afinal, você merece ter sua recompensa por todos danos sofridos… Seria egoísmo meu exigir que se sacrifique por conta de meus problemas pessoais.
— Dramático, duas vezes.
— Já disse que não estou sendo…
— O que vão querer, rapazes? — perguntou uma outra mulher, essa mais bonita que a outra, sua pele escura e lisa brilhava com as luzes do lugar — Estão juntos?
— Sim, estamos. E vamos querer a sua melhor cerveja! Vamos estar ali naquela mesa no segundo andar. Com sua licença minha lady. — disse James dando uma piscadela para a moça que sorriu para ele.
E o deus por estar atrás do rapaz, olhou a mulher de baixo pra cima com um ar de desprezo, como se indicasse só com o olhar que ela não se aproximasse dele ou do rapaz. A mulher arqueou uma sobrancelha e riu contida erguendo ambas as mãos em rendição, entendendo perfeitamente o recado do deus.
Publicado por:
- Brunna Lys Miran
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