Resgate (One shot) - Capítulo Único
Não havia muitas coisas ao qual Francis gostava. Desgostava dos fins de semana, feriados, datas comemorativas, barulhos altos, multidões, hierarquia, capitalismo… e devido a muitos traumas do passado, o natal também era irrelevante em sua vida.
A única boa sensação em sua vida era que ele podia trabalhar. Enquanto tivesse saúde para trabalhar, estaria feliz. Enquanto mantivesse a mente ocupada, pois pensar no passado fazia o ar lhe faltar. Embora, o único dia do ano que ele tirava uma folga era o natal.
Toda manhã do dia vinte e cinco de dezembro, ele vestia um terno, comprava algumas flores brancas, pegava o guarda-chuva e traçava a rota no gps para o cemitério da cidade. Ele acendia um cigarro e coincidentemente, todas às vezes, ele se tornava uma bituca nos portões de ferro e assustadores do cemitério.
Sempre abaixava o vidro para jogar o cigarro fora, na única lixeira disponível naquele lugar e, também, via aquela mulher anualmente. O mesmo vestido florido com um sorriso no rosto e um buquê de camélias na mão. Ajoelhada, parecia conversar com a lápide.
Como se ela fosse realmente responder.
Ele fazia o mesmo e não podia julgá-la por isso, porém não era algo que tinha retorno. Somente um desencargo de consciência. Mortos nunca poderiam voltar ou respondê-los.
E novamente, ano após anos, ele levantava o vidro e estacionava o carro na mesma vaga. Se não encontrasse sua vaga de costume, que seja, mas preferencialmente, gostava daquela debaixo de uma árvore que florescia com flores azuis. Ele nunca tinha visto algo tão bonito. Talvez, fosse o adubo que ela tinha que a deixava tão bela.
Dessa vez, precisou estacionar um pouco longe, mas não se importou. Ao menos, ficou num local mais fácil para saída, ele pensou.
Francis encarou o buquê de flores por algum tempo antes de tirar o cinto de segurança e se olhar o penteado uma última vez no retrovisor. Estava tudo okay. Sua aparência não estava ruim.
Incrivelmente, até mesmo as olheiras escuras abaixo dos olhos bicolores estavam amenizadas. Ele forçou um sorriso ameno e saiu do carro.
O jazigo estava no terceiro pavimento, a vigésima sétima lápide. Estava com alguma neve acumulada, mas nada que impedia de identificar o que precisava.
Amme Christine Jobs e Frédéric Jobs. Pai e mãe queridos, amantes da liberdade.
As duas pequenas fotos ovais eram horríveis. Não captavam a essência da beleza que seus pais tinham. Francis deveria dizer que não era uma pessoa feia ou com beleza comum. Sua mãe foi uma top model no passado e o pai, ex-atleta renomado de judô.
Os cabelos ruivos e cacheados da mãe estavam perfeitamente alinhados — como nunca foram em vida — e seus olhos verdes tinham um brilho que mal se recordava, já que a última vez que se lembra dela foi quando a vista morta, com o pescoço quebrado após capotarem o carro. Ela estava sem aquele sorriso radiante que lhe dava forças para se levantar todos os dias.
O pai, por outro lado, como a geração mais nova dizia, um grande golden retriever. Até mesmo os loiros dos pelos do cachorro entravam em consonância perfeita com ele. O olhar carinhoso com aquele sorriso amigável também era sua marca registrada. Mas também, era difícil se lembrar desses detalhes.
Embora o pai não tivesse morrido durante o acidente, havia passado onze anos em coma. E, por seu puro egoísmo, no natal passado, decidiu desligar os aparelhos que o mantinham vivo. Não suportava mais ter esperanças em que um dia ele pudesse acordar.
Desde então, Francis tem estado letárgico. Pesadelos recorrentes e visitas frequentes ao psiquiatra e a inúmera quantidade de comprimidos coloridos no armário do banheiro tornou-se a rotina em sua vida depois do trabalho. Enquanto estava dopado, a culpa era incapaz de consumi-lo.
— Estou aqui. Mãe… pai… — sua voz estava fraca e extremamente baixa, não parecia ter forças para falar alguma coisa — Esse ano fiz o melhor para manter a empresa funcionando corretamente. Embora os tios tenham tentado me derrubar, consegui fazê-los ficar na linha.
Não culpava os tios por tentarem derrubá-lo. A receita anual, depois que se tornou um conglomerado em suas mãos, quadruplicou. Um lucro muito considerável para não ser cobiçado.
Mas, os culpava por serem ambiciosos demais. Por não lhe darem apoio na época que estava sozinho e somente cobiçar a fortuna que os pais haviam lhe deixado. Todos aqueles velhos asquerosos tinham dinheiro o suficiente para nunca precisarem trabalhar o resto da vida, por que cobiçavam aquilo que lhe pertencia?
Felizmente, Francis não deixou que isso o abalasse e embora por alguns anos tenha deixado alguém de confiança no lugar enquanto viajava pelo mundo enquanto modelo, ao passo que descobria o que desejava para o futuro, no final, preferiu a comodidade de ser um chefe empresarial.
— Passei meu aniversário sozinho novamente. Ainda não consegui uma namorada ou uma esposa como vocês desejavam e não tive oportunidade em contar para vocês que sou gay. Então eu peço desculpas por dizer isso tão tardiamente. — engoliu a seco — Se um dia eu encontrar alguém, o trarei até aqui para apresentá-lo. É uma promessa.
Francis se ajoelhou em frente a lápide cinza e colocou o buquê sobre a grama.
— Embora esteja tudo esteja uma bagunça, eu estou bem. Não se preocupem comigo, prefiro que tudo continue dessa maneira… sinto falta de vocês.
Francis tentou forçar um sorriso, mas não conseguiu.
Era engraçado como nunca conseguiu sorrir ou chorar depois da morte dos pais, mesmo quando estava jogado no abismo. Não conseguia esboçar reação alguma, como se estivesse perdido o sentimento de luto.
— Francis?
Uma voz o tirou sua concentração. Aquela voz que o levava ao passado, trazendo os pequenos brotos prestes a florescer, mas que tinham tanto medo de mudar seu estado.
Francis olhou para trás. Um homem trajando a farda do exército, com inúmeras medalhas no peito, o encarava surpreso. Segurava o quepe nas mãos, deixando a mostra o cabelo curto rente ao couro cabeludo. Os olhos âmbar tinham um brilho de felicidade sem precedentes, mas também guardava um traço de mágoa.
— Eddie! — o órgão em seu peito bateu mais forte. — O que está fazendo aqui?
Por um segundo, ele pareceu confuso e em seguida, ele coçou a cabeça.
— Vim visitar minha esposa. — e indicou com a cabeça, não muito longe dali, a lápide com um jarro de rosas vermelhas.
◊◊
O restaurante estava cheio. Foi uma sorte Edgar ser um dos principais sócios. Para os sócios, havia uma sessão separada que estava reservada para qualquer horário ou dia da semana.
Sempre que ia até lá, precisava cumprimentar inúmeras pessoas, mas como estava acompanhado hoje, agradecia a Francis por isso. Ainda assim, a presença do seu amigo era marcante e toda a atenção, concentrava-se nele. Isso não havia mudado nada desde a última vez que se viram. Deu uma risadinha enquanto abria a porta para ele entrar.
Mas algo que havia mudado era a personalidade de Francis. Embora tivesse ouvido alguns rumores, não achava que essa mudança tivesse sido tão drástica. Francis sempre foi muito parecido com o pai em questão de personalidade. Estava sempre o seguindo, alegre e sorridente, sempre disposto a ajudar outra pessoa. O rapaz apático a sua frente, até desaparecer completamente da sua vida, era seu melhor amigo.
Edgar colocou o cotovelo na mesa e escorou a cabeça na palma da mão:
— Já faz o quê? Dez anos?
— Dez anos e cinco meses. — Francis respondeu sem emoção, mas Edgar conseguia notar algum traço de ressentimento — Desculpe-me.
— Não há o porquê se desculpar, já faz tanto tempo.
— Ainda assim, acho que devo isso a você. — ele esperou que o garçom servisse o vinho para ele — Não lhe dei uma explicação quando saí daquela forma. — ele bebeu um gole generoso.
— Já lhe disse, não guardo mágoa.
O garçom ia despejando o vinho na taça de Edgar, mas tampou a borda da taça. Ele desviou o olhar para o garçom e disse suavemente:
— Traga-me uma água com gás, por favor.
Quando retornou, Francis ainda o encarava. Não conseguia saber o que passava por sua mente. Com elegância, colocou a taça de vinho na mesa.
— Quando se casou?
— Há seis anos… — esperou mais algumas palavras, mas pareceu que o silêncio foi para que continuasse a falar — Conheci Tiffany no exército, ela era minha comandante. Uma boa mulher… tivemos um filho.
— Um filho?
— Faz três anos no ano novo. É um rapazinho adorável, meu maior orgulho. — o sorriso aumentou enquanto falava do filho — É uma pena que Tiff não vai conseguir ver o filho crescer.
— Ela…
Francis não pareceu encontrar um rumo certo para continuar sem soar ofensivo, mas Edgar, o conhecendo, sabia o que ele iria perguntar.
— Morreu em combate, foi sequestrada por terroristas no oriente médio… não houve corpo para velar.
Francis permaneceu em silêncio. Achou que havia atingido um lugar doloroso, preferiu se manter quieto e bebeu um gole do vinho. Para sua sorte, o rapaz que os atendiam, retornou com o almoço que haviam pedido. Na mesa, uma massa italiana com provolone foi servida para Francis, enquanto para Edgar, um bife wellington. E logo quando o garçom, Edgar tomou a frente novamente:
— E você, como tem passado? Soube que assumiu a empresa da família. — ele ainda se manteve na mesma posição, não tocando a comida em seu prato.
Francis pegou os talheres.
— Sim, ocasionalmente é algo que eu deveria ter feito há muito tempo. — ele baixou a cabeça e começou a comer.
“Mesmo que seu sonho fosse ser programador?”
Embora quisesse perguntar, não pareceu ser o momento certo para isso e seguindo o amigo, Edgar também começou a saborear seu bife.
Estava satisfeito por encontrá-lo, nem conseguia sentir raiva dele, pois sabia de tudo que Francis passou nessa última década. Mas, não conseguia deixar de se sentir magoado por aquele dia.
Embora tivessem bebido muito, Edgar sabia exatamente o que estava fazendo quando seduziu Francis e o levou para cama. Só Deus sabia há quanto tempo desejava isso. Ele pensou que poderiam usar a desculpa de estarem bêbados, mas quando acordou na manhã seguinte Francis tinha desaparecido.
E não apenas isso. Ele foi bloqueado de todas as redes sociais, telefone e quando tentou encontrá-lo, foi impedido de diversas formas.
Por muito tempo, sentiu nojo de si e pensou que tudo isso havia sido um castigo por enganar Francis. Entre o tempo de treinamento no exército e as noites mal dormidas, ele quase chegou ao colapso por causa disso. A sua salvadora foi Tiff, que cuidou dele e o ajudou a sair daquele estado.
Não podia dizer que amava incondicionalmente sua falecida esposa, mas ele era melhor com ela, uma pessoa que poderia sorrir e viver tranquilamente. Ele amou Tiffany, mas não da mesma forma que amou e ainda amava Francis. Era ridículo que por mais de uma década amasse alguém que provavelmente nunca lhe lançaria um olhar de amor.
— Mas estou curioso com algo, Francis. — cortou um pedaço de bife e O levou à boca — Por que você fugiu aquele dia?
Francis parou de mastigar e colocou os talheres cruzados entre a borda prato e do sousplat. O movimento não escapou dos olhos de Edgar.
— Podemos não falar sobre isso? — perguntou francamente, era algo que o deixava ansioso. Mais ansioso do que estava por encontrar Edgar depois de tanto tempo.
— Não. Foi por isso que o convidei para almoçar.
O rosto de Edgar tomou uma nota de seriedade. Suas sobrancelhas se franziram e a respiração tornou-se mais curta. Precisava de saber sobre isso ou não dormiria nos próximos dias. Ele não guardava mágoa, mas doía pensar que seu melhor amigo se afastou por nojo.
— Eddie, eu fiz algo ruim. — respondeu sem alterar sua voz, tão calmo que parecia não ter sido com ele o questionamento.
Ele era digno de tanto nojo?
— Não devia ter acontecido. — continuou — Foi um erro, não, ainda pior…
As poucas palavras deixaram-no mais amargo que se sentisse a bile subir à garganta.
— Sou tão nojento assim, Francis? — um quê de decepção cobria sua voz.
A apatia finalmente saiu daquele rosto e Francis se sentiu confuso.
Por que Eddie estava se chamando assim sendo que ele era a pessoa nojenta?
— Não o entendo Edgar. A pessoa nojenta aqui sou eu.
Do que Francis estava falando?
— Fui eu quem bebeu demais. — continuou — Eu quem o forcei a fazer todas aquelas coisas. — levou a mão à boca e ficou por alguns segundos em silêncio encarando com um olhar perdido para a massa em seu prato e depois ergueu sua linha de visão para o amigo — Por que você seria a pessoa nojenta?
De repente, depois de alguns momentos em silêncio, Edgar riu. Seus olhos se fecharam formando duas meias-luas e a risada que ecoava pelos ouvidos de Francis era a mesma que se lembrava do passado. A mesma quando ele contava uma piada horrível, eles se olhavam e caíam na risada por tão sem graça ser. Ou quando, de repente, estavam longe e encontrassem o olhar um do outro, Edgar sorria e dava uma risada sem graça.
Seu coração desafinou por um momento, culpado por se sentir feliz ao ver esse sorriso novamente. Mas, ele não tinha esse direito. Aquela sensação de desespero fazia seu corpo submergir num mar de escuridão a cada vez que se deitava na cama.
Depois da morte de seus pais, a única pessoa ao seu lado foi Eddie. Ele não sabia o que fazer e nem como agir. Passou quase um mês trancado no quarto antes de ser arrastado pelo melhor amigo até o lado de fora. O ajudou com o banho, comida e também organizou a casa.
Porém, o que trouxe de volta a realidade, foi o abraço que recebeu dele. Francis precisou do mínimo carinho para chorar até a exaustão. E a partir desse momento, começaram a morar juntos e ficaram assim por dois anos, até que houvesse aquela situação.
Francis raramente saía para beber com os colegas de faculdade, enquanto Eddie todas as sextas-feiras se encontrava com eles para isso. Mas, aquele dia ele decidiu beber porque estava próximo ao aniversário de sua mãe. Ficar sóbrio perto do início da primavera não era algo que estava em seus planos.
Ele bebeu tanto que precisou de ajuda para caminhar. Edgar também não estava em sua melhor condição, mas ao menos conseguia andar sem sentir o corpo pesado e pronto para entrar num coma alcoólico.
Chegaram em casa tropeçando um no outro e caíram no chão logo na porta de entrada. Francis não soube como aconteceu, mas quando percebeu, estavam na cama e Eddie estava gemendo debaixo dele. Com a mente nublada e confusa, ele pensou que seria um de seus inúmeros sonhos ou delírios que tinha com Eddie.
Não sabia desde quando, mas o melhor amigo havia tomado um espaço muito maior do que o esperado em seu coração. E ao notar isso, apenas aceitou a verdade. Realmente amava Eddie e amou durante todos esses anos.
O problema era a cruel realidade. Quando acordou na manhã seguinte, se desesperou ao ver toda a cena e correu direto para o banheiro. A tontura, o enjoo e o que se lembrava durante a noite. Francis saiu do pequeno cômodo apertado direto para a delegacia, onde o chutaram para fora por estar completamente fora de si.
Ele não tinha o direito de ver Eddie novamente.
— Eu deveria saber o quão inocente é capaz de ser Francis.
Edgar parecia estar aliviado. O homem de trinta anos precisou tomar um gole d’agua para se acalmar.
— Você achou que tinha me estuprado?
A palavra deferida fez o estômago de Francis embrulhar. Ele fechou os olhos com força.
— Fui eu quem o seduzi. — Edgar falou com confiança ao ver o amigo abrir os olhos, ele ainda estava tão calmo que o deixava irritado — Eu abaixei suas calças e o chupei até que gozasse em minha boca, te levei para cama e deixei fazer o que quisesse.
O militar baixou a cabeça, colocando o rosto entre as mãos e depois, envergonhado, continuou:
— Deixei de ser virgem aquele dia, Francis… — suas orelhas estavam vermelhas — Achei que você tinha nojo de mim.
Francis piscou algumas vezes e desviou o olhar, tentando entender toda a situação. Tudo havia sido uma confusão? Ele cobriu a boca, pensativo, deixando o silêncio mais aterrador. Vez ou outra espiava a reação de Eddie.
Precisava de um tempo para pensar e o outro sabia disso. Quando Francis recebia uma notícia inesperada, ele simplesmente precisava raciocinar por algum tempo antes de ter uma reação ou dar uma resposta. Ele era tão
Seu coração batia tão rápido.
— Eddie… — com a voz baixa, ele chamou pelo outro e o encarou indistintamente — você… está bem?
Não conseguia expressar em palavras o que desejava dizer. Fazia muito tempo que sequer conversava com alguém de maneira correta.
Edgar sorriu.
— Agora eu estou. — a borda de seus olhos estava úmida — Amo você.
Francis sentiu que estava difícil de respirar. Apenas duas palavras podiam e elas o deixaram tão nervoso.
Francis piscou algumas vezes e passou a mão nos cabelos dourados, parecendo estar frustrado, sem saber o que fazer. Alguns velhos hábitos nunca mudam, pensou Edgar.
— Eu… não sei o que dizer.
Edgar subiu a manga da farda e verificou as horas. Foi quando Francis olhou com mais cuidado para as medalhas e honras penduradas em seu peito. Provavelmente, antes de encontrá-lo, estava em algum evento social. Algumas medalhas se destacavam completamente.
— Preciso pegar meu pequeno no aeroporto às dez da noite. Temos muito tempo, vamos apenas terminar de almoçar por enquanto.
Como se Francis fosse um computador em delay.
— Tudo bem. — quase de imediato ele descruzou os talheres e voltou a degustar o almoço.
Edgar deu um pequeno sorriso e também voltou a comer, a carne havia esfriado um pouco, mas ainda estava apetitosa.
Duas horas depois, a porta do quarto da casa de Francis se abriu.
Eddie esperou que o dono da casa entrasse e fechou a porta atrás dele. Logo em seguida tirou o quepe e o colocou sobre o aparado. Desabotoou o relógio e logo em seguida tirou os sapatos enquanto via Francis passar pelo corredor e trancar a casa pelo painel digital da casa.
Francis colocou as mãos nos bolsos da calça, olhando através da enorme janela de vidro. Ele parecia tão solitário e obscuro, harmonizando com a decoração da casa. Como ele estava vivendo nos últimos anos?
— Segundo andar, terceira porta à direita. Já vou subir.
— Não. — Edgar se recusou e caminhou até ficar de frente a ele.
Eles se encararam diante da enorme janela de vidro.
— Não vou me separar de você. Tenho a impressão que vai morrer a qualquer segundo.
Francis, com um suspiro profundo, desviou o olhar da paisagem através da janela e o fixou-o nos olhos de Eddie. Ele sempre estava vulnerável perto dele, como se pudesse ver por meio de cada movimento que dava. Qualquer distância e parede que colocava, esse homem conseguia atravessar tranquilamente por ela e chegar até ele.
Por isso que, em todos esses anos, não permitiu que ele pudesse sequer se aproximar.
— Eddie, eu… — Francis começou, até pensou em tentar dar um sorriso, mas já tinha se esquecido como fazer isso. — Eu pensei que tinha perdido você para sempre.
Edgar levou uma mão até o rosto de Francis, acariciando suavemente sua bochecha. Isso fez com que Francis fechasse os olhos e se aproximasse, encostando suas testas.
— Eu também.
Francis passou a mão pela cintura de Edgar e o segurou com firmeza, abraçando não apenas sua cintura, mas também seus lábios. A calmaria antes da tempestade, sentindo mutualmente, confirmando que estavam ali. As batidas do coração se acelerando aos poucos assim como suas intenções. As roupas descartadas por sua inutilidade.
O quarto estava distante demais. Francis empurrou Eddie para o sofá. Estava com a respiração irregular, as bochechas coradas e o par de olhos bicolores num tom mais escuro.
“Finalmente alguma reação.”
— Vai ficar só me olhando?
Francis teve o mínimo de reação, estreitando levemente o olhar, que pela soberba deixava Edgar com uma sensação estranha de excitação. Estava um tanto ansioso por também esperá-lo desabotoar, botão por botão, das mangas, do torso da camisa. A camisa social branca deslizou pelos ombros e ele engoliu a seco.
— É fácil olhar para você. — respondeu com a voz rouca.
Ele jogou a peça de roupa sem olhar para onde ela cairia e subiu no sofá, ficando por cima de Edgar. Seus cabelos louros caíram sobre o rosto.
— Por que acha que eu sempre estive olhando? — ao passo que falava, sua mão abria a farda militar, as medalhas douradas tilintavam com o movimento da camisa — O porquê de eu estar sempre por perto para ajudá-lo?
Eles se encaravam enquanto Francis abriu a boca para chupar os mamilos de Eddie. Uma das mãos subiu do cós da calça para o tronco nu, sentindo a textura da pele, as cicatrizes espalhadas em vários tons e tamanhos. Toda vez que passava os dedos por uma delas, sentia Eddie estremecer. Ele tinha algum fetiche em relação a isso?
Apertou aquela próxima à linha da sereia, o que fez o homem cantarolar um gemido baixo. Satisfatório, Francis pensou.
— São bonitas. — sussurrou.
Edgar abriu os olhos e sua visão foi capturada por Francis.
— O quê? Nunca fui bonito.
Se Francis pudesse sorrir, ele daria um sorriso sarcástico, porque quanto mais olhava para esse homem, mais encontrava a beleza. Seja exterior ou interior, não conseguia pensar num defeito para ele.
— Suas cicatrizes, são bonitas. Seus olhos são brilhantes. — ele franziu entre as sobrancelhas — Seu sorriso me deixa contente…
O militar ficou sem ação. Mesmo quando eram apenas amigos, Francis nunca foi tão direto. Nunca o elogiou tão diretamente. Merda! Sabia o quão vermelho podia estar. Por Deus! Um homem de vinte e nove anos corando dessa forma! Ele segurou Francis pelo queixo e o beijou.
A noite era capaz de esconder muitas coisas, mas para eles, que haviam se escondido um do outro por muito tempo, preferiam a claridade do dia para se reencontrarem, se resgatarem. Não trocaram muitas palavras. Cada toque, sensação já descarregava sentimento suficiente. Sentimentos que mesmo dezenas, centenas ou milhares de palavras seriam insuficientes.
Sempre que seus olhares se encontravam, uma declaração de amor silenciosa percorriam por suas mentes e corpos em forma de impulsos elétricos, gemidos e estocadas profundas.
A sala estava preenchida pela respiração pesada de ambos e aquele olhar que Francis direcionava para Edgar o fazia ficar mais excitado. Ele arranhava as costas do outro e deixava algumas mordidas que proporcionavam ainda mais prazer a Francis.
Toda vez que Francis estocava contra a entrada apertada, sentia que perderia o controle. Não acreditava na realidade, mas quando ele escutava aquele canto rouco em seus ouvidos percebia que ele estava vivo, estava ao lado dele.
Há quanto tempo esperava por isso?
— Porra! — vez ou outra ele soltava um palavrão quando sentia Eddie apertar seu pau.
Eddie também não o ajudava. A expressão luxuriosa em seu rosto o fazia desejar mais, intensificava mais sua ânsia. Queria fodê-lo mais. Desejava traçar um caminho mais profundo. E o fato dele ainda estar com o terno da farda militar deixava tudo isso ainda mais instigante.
Francis tirou algumas mechas de cabelo da testa de Eddie, molhadas e coladas pelo suor. Ele olhou nos olhos do outro enquanto diminuía o ritmo de seus movimentos.
— Eu te amo tanto, Eddie.
Mas o que nenhum deles esperava era que com essa declaração, lágrimas escorressem pelos olhos de Francis.
— Me perdoe…
Edgar abriu um grande sorriso e entrelaçou os dedos nos cabelos dourados de Francis e puxando-o para um beijo. As pernas cruzaram-se nos quadris do outro.
— Continue… mostre o quanto me ama.
Francis deslizou a mão por sua coluna e o puxou para o seu colo. Gostava dessa posição: podia olhar para ele, ver todas as suas expressões e também olhar para onde estavam conectados. Era o tipo de arranjo que os deixava mais sensíveis e também mais a vontade. A suavidade se tornando selvageria, a tristeza tornando-se a alegria, até que a tarde caísse.
♥
— Você está bem? — Francis perguntou ao se deitar e abraçou a cintura de Eddie, aconchegando-se em seu peito.
— Tente ser fodido por você. — tirou o cigarro da boca e olhou para baixo e soprou a fumaça — Vai ser difícil trabalhar amanhã…
Francis inalou a fumaça. Já estava acostumado estar no meio de fumantes e ele mesmo era um, então não fazia sentido brigar por isso e tirou o cigarro das mãos de Eddie para sua boca.
— Levante-se, vou levá-lo ao aeroporto. — inspirou a nicotina.
— Está me tratando feito uma puta? Me fode e logo depois me manda embora? — Edgar brincou.
Francis deu um bufo irônico e se levantou, ficando sobre o corpo de Edgar, com os braços um de cada lado do corpo dele e se aproximou, bem próximo ao seu ouvido:
— Se eu tivesse tratado você como um puta, estaríamos fodendo até agora, Eddie. — soltou a fumaça do cigarro — Putas não tem sentimentos e eu não teria o mínimo do cuidado que tive com você.
Edgar podia jurar que escutou uma risada, mas estava tão concentrado nas palavras dele que provavelmente seria uma alucinação de sua cabeça. Talvez não fosse, mas ele nunca saberia.
— Okay, okay, chefe…
Do quarto para o banheiro, — onde se animaram mais uma vez — do banheiro para a cozinha e da cozinha para o luxuoso carro de um milhão de dólares, sempre estavam se tocando de alguma maneira. Um abraço, um beijo, de mãos dadas ou apenas segurando os ombros. Os lembrava do passado, quando ainda eram amigos. Estavam sempre juntos e tocando um ao outro, mesmo sem perceber.
No caminho para o aeroporto não trocaram muitas palavras, mas Edgar frequentemente, espiava Francis dirigir. Ele sempre foi muito elegante quando estava sério, mas teve outra visão quando o viu vestir um terno às dez da noite para buscar uma criança no aeroporto. Precisou segurar uma risadinha travessa, não queria tirar atenção dele do trânsito.
Estava muito caótico e a lentidão no percurso não ajudava muito, além de estar chovendo bastante. O trajeto de uma hora foi feito em duas horas e meia.
— Tem certeza que não quer esperar? Minha mãe ficaria feliz em vê-lo… pirralho também. — perguntou pela terceira vez que saíram da cobertura de Francis.
Eles estavam na calçada da porta de saída do aeroporto. Francis de costas para seu carro e Edgar em sua frente.
— Teremos alguma oportunidade no futuro. — estava muito nervoso para esse encontro.
— Olha… o quão confiante, Sr. Jobs é… — provocou.
Francis se aproximou e passou a mão em volta da cintura de Eddie:
— Não vou deixá-lo escapar tão fácil, Sr. Jonhson. — e baixou a cabeça, deixando um beijo na testa.
Edgar se sentiu envergonhado. Quando mais novo, esse rapazinho nunca o retrucava, mas ele criou uma lábia que parecia mortal para ele.
— Vá! Sua família está esperando. — deu dois tapinhas no traseiro dele.
— Tudo bem, eu vou ligar. Até mais. — Edgar lhe roubou um beijo e saiu correndo como um adolescente.
Francis arqueou uma sobrancelha e achou engraçada essa situação, não pode deixar de abrir um sorriso. Ele sacudiu a cabeça, de bom humor e entrou no carro. E quando estava prestes a dar partida, seu sorriso aumentou ainda mais ao ver a felicidade de Edgar com sua família. Era algo que ele não poderia ter mais, mas estava feliz por ele.
Pensando bem, aquele dia em que se separaram também foi no dia do natal. Ele olhou brevemente para o mar e reduziu a marcha, não havia pressa para ir para casa. Fazia muitos anos que não olhava seu arredor.
Devia agradecer Eddie por isso a qualquer momento. Ele o havia resgatado da escuridão novamente.
notas da autora: a princípio queria algo feliz, juro que tentei! Mas, é impressionante minha capacidade em escrever coisas tristes naturalmente? Será algum tipo de carma? Qual o meu problema? ps: era também para ser um conto de natal normal e bem clichê, mas 9/10 vezes não sai do jeito que eu quero.
Enfim, por hoje é só. Não se esqueçam de deixar sua estrelinha e um comentário.
CENA EXTRA:
Duas semanas depois, quando Eddie teve uma folga, coincidentemente esbarrou com Francis num shopping. Embora estivesse a trabalho, parou por algum tempo para conversar com ele. Sua mãe estava tão alegre por ter reencontrado aquele pequeno (não tão pequeno mais) garoto que vivia em sua casa! E o pequeno Frédéric, a primeira coisa que fez, foi abraçar aquele belo par de pernas de Francis, como se o conhecesse há muito tempo.
Publicado por:
- Xiao Yu
-
Às vezes, me perco em minha própria loucura e quando vejo estou escrevendo.
Espero que se divirtam lendo minhas histórias, assim como me divirto aos escrevê-las ^^
você vai me achar no link abaixo:
https://xiaoyuautora.carrd.co/
minhas outras postagens:
COMENTÁRIOS
Sua Comunidade de Novels BL/GL Aberta para Autores e Tradutores!