O Renascimento do Príncipe Esquecido - [Capítulo 03]. Quase esbarrei em minha estrela destinada, mas achei um escravo
Exatamente meio mês depois, JiuYan terminou as roupas que prometeu fazer. Sua pontualidade era incrível, assim que terminou a hora do rato, a costura havia sido feita. Shen Sheng ficou encantando, o senso estético dessa aranha era muito melhor que o dele. Na verdade, ele nunca entendeu sobre essas coisas, sempre eram seus servos ou Meng Ling que cuidavam disso para ele.
JiuYan preparou dois conjuntos para cada. Mas, ele pareceu zelar mais por sua roupa do que para os outros. Seus dois conjuntos pareciam ainda melhores que seu antigo traje celestial. O robe interno ainda era branco simples, mas o externo tinha tons em verde pastel com bordados dourados em belas flores de lótus. O tecido muito requintado e macio, além de tudo respirável. Shen Sheng detestava seda por isso, nas épocas mais quentes o tecido grudava no corpo de um jeito muito estranho. Também havia uma faixa de cabelo de mesma cor do manto externo. JiuYan se preocupou até com um adorno no cabelo para ele.
Os conjuntos feitos para o restante deles, eram exatamente iguais. Era como se Shen Sheng fosse o jovem rico e eles, os servos. Ele se sentiu estranho. Desde que ainda era criança, na época da corte, não gostava de pessoas os servindo. Shen Sheng sentia de alguma forma que essas pessoas eram inferiores à ele, quando não eram. Sua cabeça doía quando via as servas insistirem em vesti-lo, ajudarem a tomar banho, a trazer sua comida. Ele tinha perna e braços, não era aleijado, então qual o motivo dessas pessoas estarem fazendo isso por ele?
Houve uma vez em que ele explodiu de raiva aos quinze anos. Quase todas as vezes ele dispensava as servas, apenas quando seu pai estava por perto que ele as deixava ajudar. Shen Sheng queria poupar-se de problemas. Nesse dia, ele simplesmente queria ficar sozinho, mas as três mulheres insistiram em ajudá-lo.
“Sua Alteza, Sua Majestade nos ordenou a ajudá-lo.” Vendo esta situação, ele notou que seu pai descobrira a dispensa que fazia à suas servas. “Se não fizermos, mandará cortar as cabeças de nossa família!”
Estando irritado, ele gritou com elas: “Vocês servem à dianxia[1] ou à Fu Huang[2]? Esta casa está se tornando um bordel? Por que diabos almejam irritar a mim? SAIAM!”
As servas nunca tinham visto seu senhor, tão transtornado. Com medo, elas se retiraram com a cabeça baixa mais rápido que um ladrão em fuga. A verdade era que Sua Alteza, avistou sua Meng Ling conversar docemente com outro homem e pior, este homem era seu rival. Não se sabia quantas vezes este homem declarou seu amor por Meng Ling a céu claro. Este era seu primo mais velho, Shen Long. Shen Sheng, nesta época não tinha seu amor ainda. A única ligação entre eles era um contrato de casamento deixado por seu avô, antes de falecer.
Se ele soubesse que nessa época sua querida seris tão cruel, teria simplesmente jogado ela para Shen Long. No entanto, ela também teria se tornado viúva alguns anos depois de se casarem. Shen Long foi acusado e condenado por traição quando Shen Sheng tinha vinte e sete anos. O primo mais velho conspirou com outro reino para matar seu tio e imperador, Shen Gong. Foi o próprio Shen Sheng que arrancou sua cabeça no campo de batalha. Não muito depois, Meng Ling e ele ascenderam. Não havia tempo para amargura.
Por outro lado, Shen Sheng sentia-se comovido com esta atitude servil deles. Os três amigos escolheram tal atitude, escolheram até mesmo tornar-se humanos por ele. Eles faziam isso por vontade própria, cuidavam dele de vontade própria. Isso era mais valioso que qualquer coisa. No final, restou uma única palavra em sua boca: “Obrigado.”
Três dias depois, um jovem mestre carregando um coelho raivoso e seus dois servos, chamaram atenção na cidade Qin. Sua beleza fora considerado imoral até mesmo entre os homem mais selvagens e ríspidos. Shen Sheng ficou conhecido em toda a cidade.
“Sua beleza é um problema.” Hei He Bai reclamou. “Ontem à noite, quantos ladrões de flores[3] e quantos bandidos vieram roubá-lo?”
“Tirando aqueles que foram mortos pela barreira, este amável amigo contabilizou cerca de quarenta.” Jiuyan estava muito cansado.
“Peço que me perdoem por isso.” Shen Sheng não sabia se ria ou chorava. Essa foi a primeira vez que se encontrou numa situação tão constrangedora.
“Hmpf! É a primeira vez que vejo alguém se desculpar por ser tão bonito!” Goldenheart bufou. Sua aparência também era excepcional, porque as pessoas não enxergam?
“Eu precisarei de uma máscara e roupas mais comuns se não quiser chamar atenção.”
“Nunca!” Jiuyan trovejou. “Essas roupas comuns não podem ser usadas por yangzi![4].”
“Quem é seu yangzi, aranha maldita!?” Hei He Bai praguejou.
“De vocês que não é!” Goldenheart desdenhou. Ele estava recostado elegantemente na cadeira olhando as unhas. Ser humano não é tão ruim, veja que belas unhas!
Shen Sheng ficou calado. Entrar nesse tipo de discussão só iria colocá-lo como um filho inocente se intrometendo numa conversa séria entre os pais. Ele sorriu. Pare ele, todos os três eram seus pais adotivos. Eles o ensinaram verdadeiramente sobre o mundo, ensinaram a viver novamente, deram um amor ao qual nunca teve.
De repente Shen Sheng parou de sorrir e sentiu algo. O sentimento era o mesmo de quando estava morrendo, deitado no Salão Espelhado e viu aquela pequena estrela brilhar. Shen Sheng se levantou e correu para a janela do quarto.
A rua estava lotada, o horário mais movimentado do dia, por volta das dez da manhã. Transeuntes corriam para todos os lados, comerciantes gritavam para atrair clientes. Na esquina, mulheres usavam seu poder de sedução para atrair homens ao distrito da luz vermelha. Crianças corriam por entre os adultos brincando de se esconderem. No meio disso tudo, passava uma carroça humana[5] carregando um homem com um ar desleixado. Ele estava fumando e com as pernas cruzadas. Em sua mão, um chicote de escravo.
Shen Sheng franziu a testa. As pessoas ainda não largaram a escravidão.
A presença de sua estrela destinada desapareceu e então, habilmente ele pulou da janela e se sentou no telhado. Ele tirou dois pregos refinados da manga e usando um pouco de poder espiritual, jogou os pregos na engrenagem da carroça. A roda afrouxou do eixo e se partiu em duas meia luas. O homem que estava deitado deu um salto para trás, enquanto seu escravo caiu de joelhos.
“Revele-se covarde!” O homem gritou, chamando atenção de todas as pessoas na rua.
“Hei He bai, perdoe-me, mas irei chamar atenção apenas mais uma vez.” Shen Sheng disse interiormente.
Uma figura elegante pulou do telhado pousando suavemente no chão. As pessoas olharam para ele espantado. Não existe pessoa no mundo mais bonito! Estavam atordoados. Esse devia ser o jovem mestre das fofocas.
“Daozhang[6], qual o motivo de procurar este inferior?” O homem, notando que não conseguia distinguir o nível marcial desta pessoa, imediatamente tornou-se respeitoso. Ele ficou chocado, pois, ele mesmo foi considerado um gênio entre os gênios alcançando grandes feitos no mundo, mas este garoto que não aparenta ter mais de vinte anos estava acima dele? Quão talentosa essa pessoa é? Não… Não… ele descartou esta ideia. Este poderia ser um daqueles casos em que um grande mestre mantinha sua aparência. Isso, no entanto, ainda era pior. O que ele fez para esbarrar em alguém tão poderoso? Melhor, o que ele fez para ofender esta pessoa?
“Escravidão é inaceitável!” Shen Sheng não fez nenhuma menção em respondê-lo.
O homem riu.
“Se o dragão possui, porque as cobras não?”
Shen Sheng ficou atordoado. Na época em que seu pai foi imperador, ele havia determinado o fim da escravidão. O quê no mundo fez voltar a isso? “Então, deixe-me reformular a frase. ‘Para mim, escravidão é inaceitável!’ Pessoas são iguais, têm direito a liberdade.”
“Você diz que isso, é uma pessoa daozhang? Olhe para isto! Veja quantas maldições há no corpo desse verme, nem demônios são tão amaldiçoados! Quão desumano ele foi em uma vida passada para ter uma aparência como esta? Os deuses são justos!”
Justos? Shen Sheng bufou. As pessoas não poderiam estar mais enganadas sobre os deuses. Eles são mesquinhos, arrogantes, egocêntricos, gananciosos. São ainda mais perturbadores que humanos! Se os humanos soubesse disso, os adorariam ainda? Até mesmo o ladrão Zei Yu, se afastou da Corte Celestial.
“Se ele foi desumano numa vida anterior, receio que esteja pagando pelos seus pecados tendo tantas maldições em seu corpo! Escravizá-lo é exceder tal punição.”
“Daozhang é muito bom. Não vê o mal nas pessoas. Além de ser um monstro essa pessoa já matou, já roubou. Seus crimes não são puníveis?”
A cada palavra que aquele homem dizia, Shen Sheng ficava mais irritado. Essa pessoa certamente era um desavergonhado distorcendo o preto em branco. Quem no mundo acreditaria nele? Todos. Todos ao seu redor, olhavam-no com um olhar zombeteiro.
Bom… Já que este homem era desavergonhado, ele não perderia a face tão rápido. Vamos dialogar então!
“Senhor, mas você já não matou? Já não roubou?” Ele respondeu com uma expressão impassível. “Seus crimes não são puníveis? è por ele ser feio ou ser pobre que você irá escravizá-lo? Já não basta a guerra para tomar escravos?”
“Guerra é guerra.” O homem respondeu.
“Guerra é guerra.” Shen Sheng repetiu.
“Daozhang, não diga que preto é branco. Por que está comparando algo tão diferente?”
“Diferente?” Ele sacudiu as mangas, provocando um vento que derrubou algumas pessoas. “Viver não é uma batalha constante?”
“V-Você…” Gaguejando ele apontou o dedo para Shen Sheng. “Guardas! Prendam este homem!”
O quão irracional pode ser uma pessoa? Até mesmo uma besta espiritual sem consciência seria melhor!
Dezenas de homens em armaduras prateadas surgiram de todos os lados. Nos ombros um selo avermelhado dava cor à armadura. Da janela, três yifu’s[7] correram em ajuda de seu filhote, mas Hei He bai, acabou ficando. Esses dois peidos velhos eram mais que suficientes para lidar com essa poeira que se acumulava. Bem, Shen Sheng precisava de um levantar de mangas para cuidas dessas pessoas, mas Jiuyan e Goldenheart queriam se exercitar. Eles estavam observando há muito tempo o cervo que defendia um mero escravo. Eles entendiam exatamente como era isso. Ser forçado a um contrato de escravidão com um humano era o pior.
A multidão que se juntava, há muito se dispersou. Ninguém queria ser pego numa luta entre taoístas. Três homens contra uma multidão de cem. Todos os cem eram elites.
“Yangzi pode ficar tranquilo. Sente-se e aguarde exercitarmos!” Goldenheart colocou uma mão em seu ombro.
“Laozi varrerá essa poeira por Shen Sheng.” Jiuyan estralou o pescoço, ao mesmo tempo em que suas mãos. “Pavão desgraçado, espero que não quebre seus ossos ao dar um soco.”
“Velha Aranha, não esqueça que este venerável é mais novo que você!”
Ambos liberaram a pressão dos seus anos de cultivo. Goldenheart tinha cultivado quase trezentos mil anos, ao passo que apesar de mais velho, Jiuyan ainda não alcançou duzentos e cinquenta mil anos. Os guardas caíram um por um ajoelhados no chão. Aqueles mais fracos desmaiaram imediatamente.
“Diabos!” Jiuyan praguejou. Isso era muito frustante. “Mas, eles já caíram?”
“Que tal suprimirmos?” Goldenheart deu uma ideia.
Shen Sheng não pôde deixar de rir. Eram apenas esses dois que poderiam conversar tão pacificamente quando um pequeno exército estava a sua frente.
“Esqueça, eles já estão amedrontados o suficiente!” Shen Sheng se pronunciou. Ele caminhou até aonde aquele homem estava. Caído, tremendo e com as calças molhadas. Este, que olhava como uma vara de bambu tremulante para Shen Sheng, não conseguia entender o que estava acontecendo. Este homem… ele ainda tinha duas pessoas assim atrás dele? “Entendo que a escravidão é plausível…” Ele pensou enquanto conversava com este covarde. “Já que é fundamentada, por que não o vende para mim?”
O homem pelo qual estavam brigando pela primeira vez esboçou uma reação. Ele engoliu a seco. Ele não podia deixar se de ser escravo. Sua mãe e suas duas irmãs dependiam da moradia que este jovem mestre fornecia para eles enquanto este estivesse em suas mãos. Este daozhang era muito poderoso, mas sua mãe um dia disse a ele e este último concordava plenamente. Quanto maior o dragão, maior sua cauda. Este homem com quem estava agora certamente era uma pessoa ruim, mas quem garantiria que este outro era melhor? Pelo contrário, poderia ser ainda mais mau do que seu mestre. Mas, ele não ousava dizer isso em voz alta. Ele poderia morrer se o fizesse!
“O que acha, vai vendê-lo para mim?” Shen Sheng repetiu com um sorriso, que pareceu medonho aos olhos do outro.
“S-Sim!” E ele ousava recusar? Ele não era tão burro!
Shen Sheng tirou uma pequena bolsa azul da manga e jogou para o homem. Ele ficou ainda mais espantado. Havia, no mínimo quinhentos taéis de outro ali dentro! Shen Sheng caminhou até o homem que estava caído no chão, ainda sem forças e ajudando-o a se levantar, ele disse: “Agora, você terá um novo lar.”
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Glossário
[1]. Dianxia: Usado ao se dirigir a membros da família imperial, como príncipes e princesas. Significa, Sua Alteza Real
[2]. Fu Huang: Usado por descendentes do imperador/rei nas dinastias pré-Qing. Significa, Vossa Majestade / Meu Pai Imperial ou Real
[3]. Ladrões de flores: termo usado para se referir a estupradores
[4]. Yangzi: FIlho adotivo.
[5]. Carroça humana: Carroça puxada por humanos em vez de animais.
[6]. Daozhang: Sacerdotes taoístas.
[7]. Yifu: Pai adotivo.
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Apaixonando-se aos oito anos pelo fantástico mundo da literatura, Yu Ge, em busca de um sonho e apenas uma mente fértil, passou pela poesia indo para ao romance adolescente, chegando à fantasia medieval se encontrou nos danmeis (novels chinesas boys love) e na fantasia sombria aos recém-completos 23 anos. Do xianxia à dark fantasy, se diverte encontrando o caos e ambiguidade da natureza humana.
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