Knights Choice - Capitulo 7
Capitulo 7 – Alcance de Deus
Quando Esra sonhou naquela noite, ele era uma criança novamente, com os medos de uma criança. Ele correu e correu, seus pezinhos descalços espirrando sobre poças, perdido em sua própria aldeia. Em sua pressa assustada, ele caiu, rasgou o lábio na pedra, cortando bem no meio. Mas ele estava de pé novamente, correndo, correndo, contra o oceano subindo, sangue escorrendo pelo queixo. A tempestade não pararia. A água aquecida chovia do céu, o rio fumegante rompeu suas margens em uma inundação, e o mar profundo e cinzento se elevou alto e afogou as casas e salões em ondas ferozes e espuma enfumaçada.
“Ajude-me!” Ele implorou enquanto tentava fugir da tempestade, sua voz um som abafado e grossa. “Pai! Ajude-me! Me salve!”
Mas a água quente continuou a subir, atingindo os joelhos, a cintura, o peito, e ele não conseguia respirar, ele não conseguia nem gritar, como uma mão invisível enrolado em sua garganta e selando sua voz.
“Pai…” – ele murmurou, as lágrimas caindo, enquanto ele era arrastado para o mar fervente.
* * *
Ele ainda estava chorando quando acordou, a garganta apertada, ofegante, sufocada no calor e na escuridão. Mãos quentes acalmaram seus lados, enrolando a sua volta, uma voz gentil murmurou seu nome, o fez pensar, pai…
“Esra…?” Uma mão acalmou sua testa.
Seu pai estava morto. Umbra olhou de volta em seus olhos.
A vergonha fez outro soluço atravessar seu peito. Seu pai estava
morto, e ele jazia nos braços do homem que o matara. Na parte de trás de sua garganta, um assobio começou.
Instintivamente, ele respirou fundo e ouviu o assobio novamente e mais alto. Tinha muito tempo desde que ele teve um de seus ataques. Ele tinha aprendido a como lidar com isso à medida que envelhecia, sempre tomando cuidado para não se esforçar, nunca
correr muito rápido ou ficar muito tempo no ar frio. Mas sua respiração estava ficando curta, como se ele não conseguisse ar suficiente, e não parecia ter passagem por sua garganta.
O medo apertou seu peito. Era como se afogar, escorregar para baixo da água preta e subir cuspindo. Ele podia ouvir seu próprio chiado, mas não podia fazer nada para detê-lo. E Umbra não fazia ideia de sua aflição, e todos que poderiam saber o que fazer foram mortos ou vendidos, e sua aldeia se foi, e seu pai estava morto, e Esra não conseguia respirar— Vou morrer, pensou Esra, vou morrer, vou morrer…
A testa de Umbra estava franzida com preocupação. “Esra, qual é o problema?” ele perguntou, a voz rouca de sono.
Esra agarrou a mão que tentou acalmá-lo, tossindo e choramingando. “Eu, eu… n-não posso…” ele tentou, e então seu peito arfou inutilmente, cortando suas palavras.
“Tudo bem, tudo bem”, o cavaleiro resmungou. “Não fale se você não consegue respirar.”
A cama afundou quando Umbra se sentou, em movimentos lentos. Ele ainda estava acordando. Ele segurou Esra pelos ombros e o puxou para cima também, o jovem ofegante entre suas as pernas em uma posição sentada, suas costas esbeltas para de encontro ao peito de Umbra.
“Parece que você tem um assobio dentro de você”, veio a voz de Umbra por trás de sua orelha. Esra respirou fundo para se desculpar, mas não conseguiu empurrar o palavras, e rapidamente respirou mais algumas vezes para tentar novamente. Umbra o silenciou.
“Eu disse para você não falar,” ele murmurou, “Sua respiração está se movendo muito rápido.”
Uma grande mão passou sobre sua caixa torácica. “Mais devagar, comigo.” Ele respirou calmamente por Esra, alto o suficiente para ele ouvir. Respiração lenta e então para fora.
Esra podia sentir seu coração batendo sob a mão de Umbra; estava ciente de cada ponto de contato em sua pele nua, a palma forte e quente em seu peito, a largura de cada dedo estendido, segurando-o firme. Aquele toque, aquela força estabilizadora, era como uma âncora em uma tempestade. Ele seguiu a respiração de Umbra o melhor que pôde, ainda fazendo aquele som molhado assustado.
“É isso,” Umbra murmurou gentilmente. “É isso. Bom menino.”
Apesar do que estava acontecendo, aquele elogio suave colocou um calor dentro dele. Ele poderia ter chorado pelo conforto que encontrou na obediência. Mas as respirações profundas de Umbra o guiaram e a firmeza de seu toque o acalmou. Sua respiração em pânico desacelerou, e o aperto em seu peito diminuiu, quando Esra se deixou cair de volta no poderoso consolo do abraço da Umbra.
Umbra ficou com ele por um bom tempo, até que Esra teve apenas o menor chiado. A chuva havia se tornado um tamborilar suave no alto da cabana. Estava escuro como breu agora, frio em todos os lugares, menos debaixo das cobertas, ou contra a pele da Umbra. As longas pernas do cavaleiro abraçavam as de Esra, seu peito quente subindo e descendo contra suas costas. Ele era incomumente relaxado, e Esra teria pensado que ele adormeceu de novo se não fosse pelas carícias leves sobre seu tronco. O cavaleiro devia estar em sono profundo quando ouviu os sons do sonho intermitente de Esra.
“Lamento incomodá-lo”, disse Esra calmamente, quando ele se recuperou o suficiente e teve respiração para falar. “Eu… eu sofro de uma aflição… de respiração. Desde que eu era uma criança pequena. Quando eu me esforço demais, ou quando estou com muito medo, ou às vezes – eu nem sei o que fiz para que isso acontecesse, isso acontece e eu…” ele parou, envergonhado por revelar essa parte de si mesmo. “Isso é minha fraqueza e eu-eu sei que é um fardo…”
Ele queria se encolher enquanto falava, esconder o seu rosto. Ele nunca gostou de falar de si mesmo, e admitir tal fragilidade ao cavaleiro foi humilhante.
“Está tudo bem, Esra,” Umbra disse calmamente, suas mãos deslizando pelas laterais de Esra. Sua voz estava cansada. “Você teve um pesadelo?”
Tudo parecia tão infantil. “Sim”, admitiu Esra para a escuridão. Ele sonhou na maioria das noites, fantasias tão vívidas que às vezes ele acordava trêmulo na cama. Isto tinha sido assim desde que ele conseguia se lembrar.
O Cavaleiro deu um suspiro leve. “Venha aqui,” retumbou a voz de Umbra “Deite-se comigo.”
Ele puxou Esra para perto quando eles estavam debaixo dos cobertores, embora ele estivesse tendo cuidado para não colocar muita pressão na caixa torácica de Esra. Lábios macios tocando a testa de Esra, como uma flor de calor. “Não há necessidade de pesadelos”, uma voz baixa silenciou em seu ouvido. “Você não precisa temer qualquer coisa, Esra. Eu protejo o que é meu.”
Esra estremeceu suavemente. Ele sabia que Umbra acreditava nisso, que ele tinha o direito de destruir a vida de Esra, tirar tudo o que o definia e ainda posicionar-se como seu protetor. Seu possuidor.
A promessa de Umbra era verdadeira. Ele nunca falou o que não quis dizer. Mas aos cavaleiros da Ordem de Balor, as palavras tinham significados diferentes.
Uma grande mão desceu por sua espinha, descansando em seu quadril. “Durma, Esra. Eu estou bem aqui. Eu entendi você.”
* * *
Esra acordou confuso na escuridão, mente confusa, sem ideia de onde estava. Ele estava cercado por calor e uma sensação de força. Demorou um momento para perceber que ele estava sendo segurado, suas costas pressionadas contra um peito musculoso.
As memórias ressurgiram com pressa: sua pequena aldeia, ofuscada pelo mar e árvores, caindo rapidamente de vista. O céu escurecendo, para pegá-los em uma tempestade. A sensação de ser levantado, varrido para algum lugar secreto e levado por seu cavaleiro em uma cama que parecia nuvens.
Esra nunca tinha acordado com outra pessoa antes. Mesmo em seu sono atordoado, a súbita percepção de que ele estava sendo embalado tão intimamente contra o corpo de outro homem fez seu coração bater forte. E foi o cavaleiro de Balor que o segurou, uma criatura diferente de qualquer homem mortal.
O cavaleiro em seu sono parecia a Esra como um dragão em repouso, com um abraço que o protegia e o envolvia.
Esra se manteve imóvel na escuridão. Ele não se atreveu a fazer nenhum movimento, com medo de acordar o cavaleiro novamente, e talvez despertar sua ira. Depois de algum tempo, ele podia sentir Umbra despertando. O Cavaleiro cuidadosamente removeu seu braço, que tinha mantido Esra preso no lugar com seu peso. Seus movimentos eram lentos enquanto ele deslocava seu peso sobre a cama, cauteloso, Esra percebeu, para não perturbá-lo de seu sono.
A cama mergulhou ao lado dele. Seu cavaleiro se levantou e passou os pés sobre a beira do colchão com um gemido tão baixo que era quase um rosnado.
Esra olhou para as costas largas, visão turva nas bordas, os olhos doloridos e fatigados. O Descanso do Ceifador era tão escuro que ele teria pensado que ainda era noite, se não fosse pela luz da manhã que vinha do buraco ao redor da porta. Deu destaque ao corpo de Umbra, a forma esculpida de sua figura.
O cavaleiro abaixou a cabeça, esfregando as mãos pelo cabelo loiro acinzentado, e suspirou. Quando Esra se moveu ao lado dele, ele se virou para olhá-lo. Seus olhos se encontraram, pontos de luz brilhantes no quarto escuro.
“Acordei você, hein?” disse Umbra, sua voz áspera. Ele colocou a mão no quadril de Esra sobre os cobertores. “Você pode dormir se quiser. Vou checar Vaughn.”
“Está tudo bem. Eu tenho problemas para voltar a dormir,” Esra disse, a voz pequena e esgotada. Ele passou uma noite agitada, vagando entre sonhos e vigília. Houve um pesadelo, ele se lembrou, e então Umbra o havia abraçado, acalmado, enquanto seu peito se apertava. “Vaughn está…?”
“Ele vai ficar bem.” Umbra disse, acariciando-o por um momento, antes de se afastar e vestir-se. “Há uma baía de cavalos nos fundos. Escovei-o ontem a noite e o deixei quente. Ele ficou inquieto com toda a chuva martelando sobre sua cabeça a noite toda, mas é isso.
Todo aquele músculo desapareceu sob sua camisa solta, e Esra desviou o olhar. Ele se mexeu um pouco sob os lençóis, para verificar a dor. Ao contrário de sua primeira vez, não houve pontadas agudas, nada que fizesse ele se encolher. Ele doía, de um jeito ousado. Sentia-se meio morto de exaustão, mas isso foi da jornada do dia anterior, seguida de falta de sono. Seu estômago doeu. Ele estava faminto.
Umbra, vestido com sua camiseta e calções, caminhou até a frente da porta e a abriu. A luz clara da manhã se derramou no quarto e se pôs o cavaleiro aceso. Seu cabelo brilhava quase dourado, Esra pensou sonolento. O ar estava fresco depois da chuva da noite anterior. Ele ouviu o silêncio suave das árvores balançando, o leve sons dos pássaros. Eles tinham cantos diferentes para os pássaros que vivem perto da aldeia de Esra, mais doce que o grasnar de uma gaivota, mais musical.
“Esra, aqui,” Umbra disse, acenando com a cabeça para fora da porta da frente.
Ele levantou uma sobrancelha quando Esra cuidadosamente rolou para fora da cama, um cobertor enrolado ao seu redor para preservar qualquer resquício de modéstia.
“Você é uma criatura engraçada, meu garoto”, disse ele, puxando suavemente o tecido enquanto Esra se aproximou, seus olhos esfumaçados se estreitaram na luz da manhã. “Não há ninguém aqui além de você e eu.”
Esra apenas agarrou o cobertor com mais força, e Umbra riu, bagunçando os cabelos escuros do jovem. Era injusto, pensou Esra, para Umbra estar tão agradavelmente relaxado e revigorado após a noite juntos, enquanto Esra se sentia como um pano torcido a seco.
“Pronto,” Umbra disse, acenou com a cabeça para fora da porta aberta. “Vê?” Do lado de fora, sob a varanda do Reaper’s Rest, havia uma cesta, como prometido. Estava coberto por um cobertor pesado em caso de mais chuva. Esra deu ao cavaleiro um olhar questionador, e após o aceno de resposta de permissão, ele pegou a oferta. Debaixo do cobertor, a cesta estava carregada com vários tipos alimentícios: pães e queijos diferentes, tortas recheadas com carne, frutos secos e maduros da videira. Ele podia sentir o cheiro dos pães, recém-assados, e a doçura da fruta. Foi o suficiente para fazer sua boca encher de água, e seu estômago doer de fome.
Ele sentiu o calor da mão de Umbra em suas costas e se virou para olhar para dele. O cavaleiro parecia arrojado à luz da manhã, cabelos acinzentados caindo sobre feições afiadas. Seus olhos profundos percorreram o rosto de Esra. “Como você está indo?” ele perguntou, a voz suave com o que poderia ser preocupação. A mão permaneceu firme nas costas de Esra. “Estou bem”, respondeu Esra.
Não era falso. Ele estava bem, por qualquer medida física, sem examinar o estado de seu coração. “Desculpe, eu perturbei seu sono”, Esra foi rápido em acrescentar, seu olhar caindo a seus pés. Ele sentiu a necessidade, mais uma vez, de se desculpar por suas fraquezas.
“Isso acontece com você com frequência?” Umbra perguntou. “Você me disse que não podia determinar a causa”.
Esra balançou a cabeça. “Eu não tive um ataque tão grave desde a infância.” Sua mão agarrou com força a alça da cesta, apertando o
vime em sua pele. Embora o cavaleiro não dissesse nada em resposta, Esra podia sentir o peso da atenção sobre ele, e reprimiu um arrepio. “Eu… eu deveria ter avisado”, o jovem respirou, “mas vou admitir que não pensei nisso. Eu deveria ter lembrado, é claro. É a razão pela qual eu nunca viajei muito, e a única vez que tentei com meu pai…
Esra se interrompeu abruptamente, engolindo o resto de suas palavras. Sugado em uma respiração rápida e trêmula enquanto ele tremia, desejando que as lágrimas se afastassem. Ele nunca esteve tão longe de casa em toda a sua vida. A mão de Umbra não saiu de suas costas. Em vez disso, ele acariciou para cima e para baixo, em uma carícia que certamente era para ser um conforto. Seu toque era tão quente e forte, que Esra não resistiu ao seu efeito calmante.
“A jornada hoje será mais fácil”, disse Umbra, depois de um momento, com tanta calma que Esra se sentiu seguro para olhar para ele novamente. Umbra estava estudando a nova manhã. Sob seus cílios, a luz da aurora pegou em seus olhos, dando eles o brilho de prata pálido. “E veja o clima. É um lindo dia.”
E assim foi. Quando eles chegaram pela primeira vez, todos estavam envoltos em tempestade e a escuridão da noite. Agora Esra viu a terra que cercava o descanso do cavaleiro pela primeira vez; as colinas ondulantes do país alto, bem arborizadas com faias, zimbro
e carvalho. Esra estava acostumado com a selva ao redor de sua aldeia, com seus altos penhascos, sempre-vivas e espinhosas. O mundo aqui era mais gentil, e depois de seu batismo de chuva, o campo parecia ter brotado de novo, perfumado com petrichor, cada folha fresca no galho, cada folha de grama formada de veludo. A brisa da manhã estava fresca e leve em seu rosto. Isso fez Esra agudamente consciente de sua própria sujeira. Ele podia sentir a noite deles juntos, enjoativo grudar na pele dele.
“Há um rio por perto? Para tomar banho?” Quando Umbra olhou para ele de soslaio, o jovem não pôde deixar de balbuciar: “Eu… não me sinto limpo”.
O cavaleiro sorriu; então, ele olhou para o jovem com mais atenção. O rosto de Esra aquecido pelo olhar curioso. Ele não sabia, mas o cavaleiro achou o rubor em suas bochechas bastante lindo tornando-se adorável. “Você acha que as pessoas vão dar uma olhada em você, e saber o que fizemos?”
Esra abaixou a cabeça, envergonhado. Era realmente o seu medo.
Umbra sorriu. “Nunca viu seu próprio rosto? Preciso te dar um espelho, meu garoto. Você parece puro como uma flor. Você parece incorruptível mesmo quando estou dentro de você, de alguma forma mantém a inocência.” Ele assistiu com grande diversão, como Esra gaguejou e engasgou, o rubor se aprofundando nas bochechas em mortificação, antes de dizer: “Eu prefiro banhos quentes”.
“E-eu posso aquecer água para você,” Esra ofereceu, sentindo a necessidade de um banho mais do que sempre, sua voz um pequeno gaguejar. A mão de Umbra em suas costas acariciou a forma de sua cintura. “Eu não pediria isso a você, além disso, não temos banheira. Estava falando do grande balneário na capital. Águas de todas as temperaturas, sabonetes, aromas e…” ele disparou um meio sorriso para Esra, “… em nome de Balor, um homem pode perder a civilização.”
Esra esfregou o braço e assentiu hesitante. Ele cresceu com poucos confortos das criaturas, e só conhecia o luxo da capital pelas histórias de os fugitivos que ali moravam. “Não estamos longe, se é isso que o aflige”, disse o cavaleiro. “Estaremos na capital pela tarde.”
Esra quase deixou cair a cesta do café da manhã. “Estamos indo para a capital?” ele perguntou, seu coração martelando em seu peito enquanto Umbra assentiu. Tudo o que Esra sabia do mundo exterior foi reunido a partir das histórias que ele foi informado. Quando criança, ele ouvia maravilhado as histórias da capital. Um castelo branco e alto, construído em uma cadeia de montanhas, com um rio fluindo abaixo dele que corria de cachoeiras, pela cidade, até o mar. Um lugar movimentado e cheio de todos os tipos de pessoas, assustadoras e belas, onde se poderia fazer fortuna e a aventura aguardava qualquer um ousado o suficiente para responder ao seu chamado.
Aqueles que contaram tais histórias não mencionaram os horrores quando foram falando com uma criança, é claro. Foi só quando ficou mais velho que ele veio para entender a capital pelo que ela era: o Trono de Balor, a fortaleza da besta marinha. Quando ele era pequeno, ele não queria nada mais do que vê-lo. Agora, o pensamento trouxe mais pavor do que admiração. Ele ainda não sabia o que iria acontecer com ele, qual seria o seu lugar quando eles terminassem sua jornada. Tudo que Esra tinha era as intenções de Umbra, que ele o guardaria e o protegeria.
Ele virou seu olhar para Umbra, então. O cavaleiro estava observando cada expressão piscar no rosto de Esra, e a atenção aqueceu as bochechas de Esra. Ele colocou sua mão sobre a de Esra, onde seus dedos agarraram a cesta. Admirado com que facilidade a mão do cavaleiro engoliu a sua.
“Você começa a comer esta comida, antes que eu volte.” Uma ordem delicada. Esra assentiu. O cavaleiro deu um beijo na testa, casto como um herói dos contos de fadas, então passou por ele no ar fresco da manhã.
* * *
Esra desembalou a cesta na mesa de jantar de madeira e a colocou de volta para fora a porta da frente. Finalmente sozinho, ele se preparou para o dia. Vestiu-se rapidamente em suas roupas secas ao fogo, penteando com os dedos pelos emaranhados de seu cabelo até que escorregou sobre sua palma como seda. E Umbra gostava de tocar seus cabelos. Raios de sol se derramaram pela porta aberta, brilhantes o suficiente para iluminar o quarto, pegando os grãos de poeira que subiam em espiral enquanto ele andava, como pequenos vaga-lumes. Era pacífico, pensou ele, neste lugar privado, com o canto dos pássaros no ar, seu cavaleiro do lado de fora cuidando do cavalo. A beleza idílica era quase onírica.
Era estranho o suficiente para ele, por um momento, questionar sua realidade. Onde ele estava, realmente? Ele ainda estava sonhando, ainda para acordar em outra, mais cruel, existência? Apenas dois dias atrás, ele teve que tropeçar em um campo de corpos pertencentes aqueles que ele conhecia, o chão tão coberto de morte que não se podia evitar pisar na terra salpicada de sangue. Ele ainda podia ver a fumaça preta, as sombras dos cadáveres murchos perfuradas por estacas subindo do chão em um empalamento.
Não fazia sentido que só ele pudesse sobreviver. Ele não tinha feito nada para merecer este refúgio. De todos que ele conhecia, ele sempre foi o único que era o mais carente. A culpa o atormentava, mesmo quando ele punha a mesa, tornando-a apresentável para seu cavaleiro. A visão da recompensa colocada na frente dele fez seu estômago roncar novamente, e Esra agarrou-o.
Ele não tinha comido desde a manhã anterior, mas havia cortesias tão comuns que até mesmo uma pequena aldeia escondida vivesse por eles. Os anciãos deveriam ser respeitados, assim como a posição e a oposição. Os cavaleiros eram o maior poder da terra, ao lado de seu deus. Um camponês comendo diante de um cavaleiro da Ordem? Tal violação era imperdoável. Não, Esra não se atreveu a tocar em um pedaço de comida, não importa o quão forte estava sua fome. Em vez disso, ele se distraiu arrumando o quarto, arrumando a cama e arrumando as coisas em ordem. Afinal de contas, Umbra tinha ficado satisfeito com essas coisas antes.
Na mesa lateral estava colocado o aço enegrecido da armadura do cavaleiro. Suas bordas afiadas captavam a luz do sol da manhã através da porta aberta, dando-lhe a aparência de balançar os móveis.
Esra aproximou-se, como se estivesse atraído. A máscara assentava perfeitamente no polido da madeira, duramente angular, surpreendentemente elegante. A curva geométrica brilhava, a luz deslizando sobre os detalhes que fizeram Esra pensar em uma fera viva. Ele estendeu a mão, com ambas as mãos trêmulas. A superfície era de metal liso, assustadoramente frio ao toque. Pesava muito em suas mãos. Com cautela, ele virou. O interior tinha a forma do rosto de um homem, mas não havia maneira de ver através dela, e de jeito nenhum Esra poderia fazer até mesmo tentar. .
Acima da testa havia uma espiral de metal, como uma enorme impressão digital, ligeiramente sulcado, espiralando em direção ao centro da testa. Algo sobre essa perfeição da forma na máscara o aterrorizou, e ele rapidamente recolocou a máscara na mesa.
O que ele estava pensando…?
Nervoso, agora, ele ajustou a máscara na mesa lateral, certificando-se que tudo estava exatamente como ele encontrou. Ele teve que se afastar antes que a estranha tensão pudesse deixar seu corpo. Parando diante da lareira, ele pensou, talvez ele devesse varrer as cinzas, antes que as fuligens corram com o vento e a luz e se estenda ao longo da sala. O cavaleiro parou na soleira da porta antes de entrar, o sol lançando sua figura imponente em silhueta. Ele estava olhando para Esra, seu rosto sereno e ilegível, como uma estátua.
“Você não comeu?” ele perguntou. Esra engoliu nervosamente. Ele tinha feito algo errado? “Eu estava esperando por você.”
Ele olhou para seus pés quando o cavaleiro se aproximou dele. Seus olhos deslizavam fechados quando uma mão elegante colocou o seu cabelo atrás da orelha. Umbra o considerou. “Olhe para mim.”
Esra inalou trêmulo e forçou os olhos para cima. Ele viu um borrão de pele pálida e cabelos acinzentados, e Umbra o beijou. Dele cílios longos contra sua bochecha, e ele moveu sua boca tão docemente que Esra engasgou com isso, seus olhos piscando fechados. Ele se rendeu, seu coração batendo forte, e retribuiu o beijo. Instintivamente, suas mãos foram para o peito de Umbra, e ele enrolou os dedos no tecido da camisa.
Quando Umbra bebeu o suficiente de Esra no beijo, se afastou, os olhos de Esra estavam embaçados novamente. Ele não afrouxou o aperto em Umbra e olhou para ele, sem palavras.
“Você deve estar com fome,” Umbra disse. Sua voz era baixa, com sua própria fome. “Sente-se comigo.”
As palavras causaram um arrepio em Esra. O cavaleiro disse a mesma coisa para ele na sala de reuniões, naquela noite violenta. Quão agudo foi seu terror, frio como uma lâmina; sem saber o que o cavaleiro queria dele, o que se esperava dele. Lá fora, as fogueiras ondulavam contra o céu escuro.
Mas tudo estava diferente agora, com a luz do sol e o canto dos pássaros, este silêncio em uma linda manhã.
Esra se sentou. Ele estava faminto, mas sabia que deveria esperar sua vez. Ele obedientemente cruzou as mãos à mesa, para mostrar sua deferência, para que o cavaleiro pudesse ter sua primeira escolha em tudo. “Vá em frente, Esra,” Umbra o encorajou. “Não há necessidade de cortesia, agora. Você tem fome, não comeu um dia inteiro, e você é uma coisa tão frágil que pode desmaiar.”
Esra hesitantemente pegou o pão, seus olhos em Umbra o tempo todo, para ter certeza de que isso não era algum tipo de armadilha. Mas nenhuma repreensão veio. Mesmo quando ele levou o pão à boca, Umbra apenas deu um aceno encorajador em retorno.
Com isso, Esra finalmente relaxou, e rapidamente encheu seu estômago com as generosas oferendas que os aldeões tinham feito.
Ele estava invadindo, ele tinha certeza, estava invadindo os direitos de alguém muito maior do que ele mesmo. Mas faminto como estava, estava grato pela permissão. A cadeira de Umbra rangeu quando ele se recostou para absorver a serenidade da cena a sua frente pela manhã, e ver seu cativo quebrar seu jejum.
* * *
O ar cheirava fresco e suave. Vaughn trotou sobre grama verde e exuberante, por onde as flores desenrolam suas pétalas. A luz do sol filtrada através de folhas jovens, projetando formas etéreas ao longo do caminho da floresta. Ele os manchava de luz e sombra, e brilhou na armadura da Umbra em flashes lascados, como a luz do sol brilharia sobre o oceano. O caminho deles, uma trilha de terra, acabou encontrando uma estrada bem cuidada. Esra avistou chaminés, telhados, fumaça subindo no ar. Não uma, mas duas torres altas ele podia ver por cima das árvores, sinais de um lugar mais povoado e aglomerado do que ele já tinha visto antes em sua jovem vida. “Essa é a capital, Sir Knight?” ele perguntou, sua mão segurando o manto preto. “Deve haver tantos morando lá!”
Ele ouviu a garganta de Umbra travar, e então o cavaleiro tossiu para suprimir um riso. “É Hornfast”, disse ele. “Apenas um município que comercializa… materiais de construção, Eu acredito. Não tenho certeza. Eles cuidam disso. Nós comemos sua comida para o café da manhã. Ah — acrescentou ele, um pouco desamparado. “Se ao menos a jornada pudesse ser tão curta.”
Mesmo protegido por sua máscara, Esra podia dizer que o cavaleiro estava ansioso para chegar em casa. Ao passarem pela estrada que se alargava, Esra viu o município de Hornfast à distância; suas muitas casas e salões, e seu povo, embora ele só podia vê-los como pontos ocupados, movimentando-se de um lugar para outro. Sua pequena aldeia parecia nua em comparação. Ele descansou a bochecha nas costas de Umbra. Quão pouco ele tinha visto do mundo…
Umbra acariciou sua perna. “Se você acha que Hornfast é impressionante, você pode desmaiar ao ver o Trono de Balor.”
Nos limites da cidade, um poste alto de madeira escura se projetava no céu, mais alto que a igreja, mais alto que as torres. Como um pinheiro perene, despojado de todos os seus ramos. “Umbra,” ele perguntou. “O que é essa estrutura…?”
Umbra olhou para cima. “É um Alcance de Deus”, disse ele. “Eles são todos pequenos em cidades como esta. Em certos dias, eles enviam tributos ao Deus Rei.”
Homenagens? Oferendas, talvez, animais, ou…
Esra engoliu em seco. Sua mente pulsava com a compreensão repentina. Quando era criança, uma jovem veio à sua aldeia. Ela chegou nas primeiras horas da noite, coberta de poeira das estradas, seu corpo esbelto à beira do colapso por exaustão. Marten a recebeu na reunião no salão, como costumava fazer com os recém-chegados, para acalmar seus nervos e dar as boas-vindas com comida e bebida. Naquela idade, Esra havia se agarrado ao lado de seu pai quantas vezes lhe foi permitido, desde que não atrapalhasse. Ele se escondeu perto da porta, escutando secretamente, enquanto ela contava sua história a Marten. Sua família iria sacrificá-la, ela disse. Sacrifício era a palavra Esra não tinha entendido na época. Mas ela enganou seus guardas e fugiu na selva na noite anterior para que ela pudesse ser enviada para Balor. Mais tarde, ela não tinha para onde ir. Ela não podia buscar refúgio em outra cidade, por medo de ser descoberta. As pessoas da cidade imediatamente a expulsariam assim que eles descobrissem quem ela era, ou poderiam fazer com ela pior ainda. E ela certamente não poderia voltar para sua mãe e seu pai. No entanto, a menina confessou, ela não podia culpá-los, pois eles também estavam com medo, da ira de Balor e das outras pessoas da cidade. Então ela tinha quebrado em soluços – sons tão feridos e de partir o coração – com uma intensidade que tinha assustado o jovem Esra.
Ele tinha pensado nela como uma mulher adulta, na época. Mas agora, pensando sobre isso, ele percebeu que ela devia ser bem jovem, apenas 15 ou 16 anos no máximo. À medida que Esra crescia, ele aprendeu que todas as cidades e vilarejos de Fomoria tinha um Alcance de Deus, sinais do domínio da besta sobre o campesinato. Balor exigiu que seus seguidores prestassem homenagem. Um presente de algo precioso, como dizia o ditado.
Geralmente era uma jovem donzela. Uma de suas próprias filhas, bela de rosto e forma, cuja aparência agradaria ao Deus Rei. Sempre que o padre teve uma visão predizendo que sua cidade logo seria abençoada pela presença do Deus Rei, uma oferenda tinha que ser feita. Foi uma grande honra ser escolhido, os outros aldeões diriam, enquanto amarravam a donzela à Campina, e a ergueu para ser arrancada das nuvens pela mão monstruosa de Balor.
A história tinha horrorizado Esra. Como as pessoas da cidade poderiam ser levadas a fazer tal coisa, e com um de seus próprios filhos?
“Eles fazem isso pela paz”, seu pai lhe dissera. “As pessoas vivem com medo, e sacrificando apenas um, eles acreditam que garantem a segurança da aldeia como um todo. A enormidade do ato em si é emocionante, e depois há um sentimento de grande alívio, quase gratidão por Balor. A fé é convincente, e este ritual dá aos camponeses uma ilusão de poder sobre seus indefesos na situação.”
Ser um sacrifício era uma posição de honra. Ela deve desistir de sua vida voluntariamente, como um presente ao deus que tanto lhes havia concedido. Em execução longe, a menina de sua infância havia cometido o pecado mais blasfemo que o camponês podia. Esra não podia imaginar o sentimento de traição, sua horrível solidão e vergonha. Marten olhou para seu filho nos olhos. “É para isso que serve o ritual, Esra. Para treinar o corpo para a submissão.”
Esra estremeceu contra as costas de Umbra, desviando os olhos do Alcance de Deus, tentando não pensar em quantos haviam perdido a vida ali. Se o cavaleiro sentiu ele tremendo, ele não disse nada, e por isso, Esra ficou grato.
* * *
Seu primeiro vislumbre do castelo veio no momento em que eles contornaram os penhascos dos pilares – uma cidadela alta e pontiaguda ao longe, branca contra os campos verdes, alcançando mais alto do que as montanhas para o céu azul claro. Um suspiro divertido de Umbra. “Essa é a capital. Trono de Balor. Quando o Deus Rei veio do abençoado oceano para estas terras, ele mesmo o ergueu do chão. É a maior cidade de Fomoria. E, eu acho, o mais bonito.” — E você mora lá? Esra perguntou, em admiração silenciosa.
“Sim.” Ele podia ouvir o sorriso nas palavras de Umbra e entendeu seu orgulho. O Trono de Balor era realmente um espetáculo para ser visto. Embora Esra tivesse ouvido contar as histórias, a grandeza absoluta desta graciosa cidade de muros altos ofuscava qualquer coisa que ele poderia ter conjurado em sua mente. Ele não conseguia compreender o tamanho dele. Apesar de sua beleza, havia algo de estranhamente agourento sobre a magnífica estrutura. A perfeição das formas na sua construção, a brancura brilhante das paredes, fez os olhos de Esra doerem se ele olhasse para ela por demasiado tempo. Para tal castelo ser construído por mãos humanas… era impossível. Vaughn caminhou firmemente.
“A cidade em si é o lar de todo tipo de gente,” Umbra disse a ele. “De ricos para pobres. O castelo fica no ponto mais alto da cidade. Suas asas inferiores são para os nobres e outras pessoas honradas. Os servos e escravos vivem na barriga. Balor e seus cavaleiros da Ordem vivem nas alas superiores.” Esra tentou imaginar onde ele poderia se encaixar nesse arranjo, nos quartos, ou como escravo, ou… “Umbra, me perdoe,” ele arriscou, trêmulo, “Mas o-onde eu vou morar?”
O cavaleiro inclinou a cabeça para Esra. “Comigo, claro. Segure firme.” Ele guiou Vaughn mais rápido, encerrando a conversa.
Continua…
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- Black Paradise
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