Blood Camellia - 2
Seoul, Coreia do Sul, 2020
Como em todos os dias de sua vida, mais uma vez a manhã nascia e os raios de sol atravessavam as cortinas brancas e finas do quarto de Oh Sunoo iluminando sua face repousada no travesseiro. Um novo semestre na faculdade se iniciava, o deixando cada vez mais próximo de uma pseudo independência familiar.
Sua faculdade de moda era o que iria salvá-lo. Sua única liberdade, sua válvula de escape, o porto seguro onde se refugiava em noites tempestuosas. E implorava a todas as divindades que fosse aquilo que lhe tornaria alguém livre, sem se prender nas amarras familiares que traziam apenas dor e sofrimento, uma falsa segurança que o impedia de expandir os ares, uma falsa liberdade que apenas te prende mais e mais na escuridão eterna.
Igual a todas as manhãs, sua família estava sentada na mesa da sala de jantar, apenas o esperado para a refeição, no segundo que pisou seus pés no cômodo, sua mãe lhe lançou um olhar de cima a baixo, avaliando toda sua roupa.
“Sua roupa não está tão adequada, mas pelo menos não é como as roupas desses jovens ordinários que vão para sua faculdade.” Hyuna não era exatamente um exemplo de mãe, era controladora e nunca fazia um elogio, sempre uma ofensa disfarçada, a família de um político como seu pai, Sooman, devia estar sempre impecável, nenhuma mancha na fachada de ouro, e sua mãe garantia com todas as forças isso.
Durante todos os 19 anos de sua vida, havia sido controlado assim, seus modos, pensamentos, roupas, amizades, vida acadêmica, cada detalhe de sua rotina. Só foi capaz de fazer duas únicas escolhas em sua vida, seu curso de moda, cuja o qual havia gerado uma briga terrível em sua casa, essa que só foi resolvida quando viram que a alta sociedade apoiava jovens prodígios, e sua sexualidade, cuja a qual seus pais não tinham o mínimo conhecimento, mas a cada momento que os ouvia falando sobre quão errado era a existência de homossexuais, em como era contra a evolução.
Sentou-se à mesa ao lado do irmão mais novo, Jihyun, lhe fazendo um leve carinho na cabeça e com as mãos unidas junto a dos pais, o dia começou novamente.
“Pai Nosso que estais no céu, santificado seja o vosso nome, vem a nós o vosso reino, seja feita a vossa vontade assim na terra como no céu. O pão nosso de cada dia nos daí hoje, perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido, não nos deixei cair em tentação mas livrai-nos do mal. Amém.” A oração matinal era sagrada em sua família, sendo seus pais muitos religiosos, o que às vezes parecia apenas mais uma fachada política, ninguém podia falar durante esse momento, todos de cabeça baixa e olhos fechados.
A caminhada até o campus era curta, apenas quinze minutos, na maioria das vezes seus pais o levavam, mas em dias belos como aquele, preferia ir sozinho aproveitando as árvores ao redor das ruas que o acalmavam e deixavam sua criatividade voar, cada folha que passava por sua visão lhe trazia uma nova ideia. Alguns professores lhe consideravam um gênio, que todas as suas criações o trariam um sucesso ilimitado, apesar disso Sunoo apenas sentia que eles estavam o sufocando, em alguns momento o fazia repensar o motivo de ter escolhido moda. Mas quando estava próximo a natureza e se deixava aproveitar, sozinho em meio aos seus pensamentos, o sentimento de felicidade lhe invadia.
Como todas as manhãs no campus, seu namorado, Ong Hyuk, estava o esperando em um banco próximo da área de fumantes junto a seus amigos. O casal havia se conhecido em uma reunião de alunos prodígios no campus há um ano atrás, não que o namorado fosse um prodígio, mas sua presença havia sido requisitada por ser o presidente do grêmio estudantil, todos os anos essa festa era dada pelos professores para apresentar os seus calouros que tinham o maior potencial, tanto aos outros professores quanto ao grêmio, apenas mais um meio dos professores tentarem elevar seus próprios egos.
E naquela noite eles se encontraram pela primeira vez, Hyuk havia sido aquele a se aproximar primeiro, se apresentando como o presidente do grêmio e todo seu relacionamento se construiu a partir desse momento, mesmo que Sunoo houvesse ficado receoso com a aproximação repentina, depois de alguns dias com o jovem Ong o perseguindo e flertando, eles acabaram se dando melhor e em um mês estavam namorando, tudo graças a aquela primeira pequena interação. Ainda que, às vezes, seu namorado fosse difícil, ciumento e um pouco violento, isso não importava para o garoto, pois ele o amava e essa era apenas a forma distorcida de demonstrar do namorado.
Todos os dias desde então sua rotina havia se concretizado, sempre a mesma coisa. Ficava junto ao namorado em alguns bancos próximos do estacionamento enquanto os horários de aula não começavam, às vezes aquele momento se tornava um pouco desconfortável por conta dos amigos de Hyuk, mas nada com que precisasse se importar realmente. As aulas eram sempre um pesadelo, ainda que a maioria dos professores o amassem, os colegas não compartilhavam tanto desse sentimento, a vontade deles de atrapalhar e prejudicar seu trabalho era constante, todos com inveja de seu talento e da atenção que ele recebia, como se em algum momento tivesse pedido por essa atenção, Sunoo apenas desenhava o que sentia, não queria ser o centro de tudo e muito menos ser constantemente ofendido por seu trabalho, sua única vontade era fazer o que amava e viver disso.
A faculdade de moda era formada de pura concorrência e todos precisavam de contatos, mas ter um aluno que se destacasse sem nenhum tipo de contato externo ou interno era um acontecimento raro, que causava um grande incômodo a todos, claro, a família de Sunoo era de classe alta e seu pai tinha influência, mas que nunca foi usada na universidade, se estava estudando ali era por mérito próprio. Nas pausas que seguiam as aulas, ele ficava com Hyuk, sempre rodeado de pessoas, nunca podendo contar com a paz que o silêncio trazia, mas haviam dias em que conseguia fugir e achar um canto secreto para relaxar.
Uma vez por semana, às sextas, um pequeno grupo se reunia, o clube de viagens da faculdade nomeado pelo vice-presidente de ‘Club de Voyage’, um momento onde vários cursos se misturavam com um único propósito, planejar uma viagem. Todos os meses, mesmo que por um final de semana, eles viajavam para alguma localização, tanto dentro do país quanto fora, em sua maioria natureza, e isso era perfeito para Sunoo, pois sua criatividade poderia vir dos locais mais inesperados, cada viagem era como uma nova coleção de obras prontas para serem costuradas. Ainda que ele não interagisse com os outros membros nas reuniões e viagens, era um momento onde ele fechava os olhos para todos os problemas e se concentrava em seu processo de criação.
Em uma de suas viagens, para a montanha Chiri-san, não havia conseguido apenas um look ou outro mas sim uma coleção completa de primavera-verão com um conceito levemente ligado aos trajes tradicionais coreanos e alguns detalhes de flores feitos a mão que deixou seus professores de boca aberta, tanto quando ainda estava no papel quanto depois de costuradas.
E mais um dia, lá estava ele junto ao namorado, sentindo-se como uma esposa troféu que tinha o dever de ficar quieta em meio aos colegas do marido, no entanto, enquanto ele observava os carros chegando no estacionamento como se fossem as coisas mais interessantes do mundo, algo surgiu, algo que ele nunca esperaria quando se levantou de manhã, algo que talvez ele nunca tivesse realmente esperado, algo… Não, alguém que em tão pouco tempo poderia mudar a sua vida de uma forma inimaginável.
Que aquele homem saindo daquela Lamborghini preta lhe traria um sonho que ele não sabia ser capaz de sonhar.
Que aquele homem que por baixo do sobretudo preto escondia tatuagens e um corpo cheio de cicatrizes realizaria seu sonho mais profundo.
Que esse homem que por baixo dos óculos de sol aviador escondia olhos azuis como um mar turbulento lhe salvariam sem saber que precisava ser salvo.
Que lhe traria sua liberdade.
Sua amada liberdade.
Sua camélia.
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